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PASQUALE CIPRO NETO
"Haja vista o que ocorreu..."
Existem as expressões "haja visto" e "haja vista", mas é bom saber que a primeira é bem diferente da segunda
NA SEMANA passada, analisei
alguns casos do emprego do
verbo "haver". O mote foi
uma declaração de um magistrado
("É necessário que hajam provas..."). Numa passagem do texto,
escrevi isto: "Quando se sai desse
tempo verbal, a coisa se complica,
haja vista o que ocorreu na frase...".
Muitos leitores escreveram para
perguntar sobre a expressão "haja
vista". Alguns chegaram a questionar a legitimidade da construção:
"Sempre ouvi dizer que não existe
"haja vista", que só se emprega "haja
visto", em qualquer situação".
De início, é preciso dizer que
existem as expressões "haja visto"
e "haja vista", que são bem diferentes. A primeira ("haja visto") é uma
locução verbal formada pela primeira ou terceira pessoa do singular do presente do subjuntivo do
verbo "haver" ("haja") e pelo particípio do verbo "ver" ("visto"): "Eles
esperam que eu haja visto o relatório"; "Suponho que ela haja visto o
filme". Se alguém diz isso hoje em
dia, é outra coisa, mas é incontestável a existência dessas construções
em certos registros da língua.
Hoje, na linguagem corrente, é
mais comum o uso de "tenha" nos
exemplos vistos ("Eles esperam
que eu tenha lido..."; "Suponho que
ela tenha visto..."), embora em outros tempos verbais não seja nada
insólito o registro de "haver" ao lado de um particípio ("Nenhum dos
alunos havia lido as obras").
Passemos à expressão formada
por uma flexão de "haver" e pelo
substantivo "vista". Destacam-se
três dos diversos usos dessa locução. O primeiro (e mais simples)
consiste no emprego puro e simples de "haja vista" como expressão invariável, qualquer que seja o
elemento a que se refira: "Jogar
contra o Milan em Milão não é nada fácil, haja vista os resultados das
últimas partidas lá realizadas"; "O
desempenho dos estudantes brasileiros vai de mal a pior, haja vista as
avaliações divulgadas recentemente por diversos organismos".
Vejamos agora os outros dois
usos. Um deles consiste em empregar o verbo "haver" como variável,
caso em que passa a significar algo
como "receber", "ser alvo de": "Jogar contra o Milan em Milão não é
nada fácil, hajam vista os resultados das últimas partidas..."; "O desempenho dos estudantes brasileiros vai de mal a pior, hajam vista as
avaliações divulgadas recentemente por diversos organismos". Em
"hajam vista os resultados/as avaliações", tem-se algo semelhante a
"recebam ("sejam alvo de') vista
("exame/análise/observação') os
resultados/as avaliações".
Por fim, o terceiro uso, quase restrito à linguagem erudita. Consiste
no emprego do verbo "haver" como invariável ("haja", que equivale
a algo como "ocorra"), mas com o
substantivo "vista" a reger a preposição "a": "Jogar contra o Milan em
Milão não é (...), haja vista aos resultados das últimas..."; "O desempenho dos estudantes (...), haja vista às últimas avaliações...".
No segundo e no terceiro uso, fica implícito algo como "basta que"
("...basta que hajam/recebam vista
os resultados/as avaliações";
"...basta que haja/ocorra vista aos
resultados/às avaliações").
O prezado leitor notou que, no
último exemplo, surgiu um acento
grave ("haja vista às últimas avaliações")? É por essas e outras que
muita gente prefere a expressão
"haja vista", fixa, invariável. Mas,
cá entre nós, ninguém morre por
conhecer outras opções. É isso.
inculta@uol.com.br
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