|
Próximo Texto | Índice
EXCLUSÃO SOCIAL
Prefeitura recolheu equipamentos que serviam de abrigo para moradores de rua sem a presença de assistentes sociais
Sem "casa de boneca", criança fica na rua
Marlene Bergamo/Folha Imagem
|
O menino I., uma das crianças que estavam abrigadas em uma casinha de madeira perto do shopping Tatuapé, na zona leste de São Paulo |
AFRA BALAZINA
FERNANDA MENA
DA REPORTAGEM LOCAL
A gestão José Serra (PSDB) recolheu ontem as pequenas casas
azuis de madeira, com um metro
e meio de altura, que viraram
abrigo para moradores de rua de
São Paulo. A ação, porém, foi feita
sem a presença de assistentes sociais, e os moradores do local, três
crianças, foram deixados na rua.
O equipamento, que lembra casinhas de boneca ou de cães, foi
instalado no domingo pela Associação Casa da Criança de Nossa
Senhora Aparecida. Antes disso,
as crianças dormiam na rua.
Segundo o próprio secretário
municipal da Assistência e Desenvolvimento Social, Floriano Pesaro, a Subprefeitura da Mooca tirou as duas casinhas, perto do
shopping Tatuapé (zona leste), na
hora do almoço e só depois as assistentes sociais foram ao local.
Mas os garotos já não estavam lá.
O subprefeito da Mooca, Walter
Bellintani, admitiu que houve um
erro e diz que irá apurar por que
assistentes não estavam no local
para levar os meninos a um abrigo. Mas diz que a ação era necessária porque havia uma ocupação
irregular do espaço público.
Segundo especialistas ouvidos
pela Folha, que mostrou ontem a
procura de moradores de rua pelas casinhas, a situação expõe a situação dessa população.
Sem assistência
Até o início da noite, as crianças
não haviam recebido nenhum tipo de atendimento da prefeitura.
Após as 18h, a assessoria do prefeito perguntou à reportagem onde poderia encontrá-las.
À tarde, as crianças foram para
a associação que cedeu as moradias. "Vou ter de procurar outro
lugar para elas ficarem", disse a
presidente da entidade, Lusia Lopes da Silva. Ela diz que não voltará, por enquanto, a instalar as casinhas. A intenção era colocá-las
na Sé e na República.
"A ação da prefeitura foi emblemática: eles retiraram as casas
sem se importar com as pessoas.
Não respeitaram o sentimento de
proteção que as casinhas tinham
para as crianças", diz o padre Júlio
Lancellotti, da Pastoral do Menor.
"A retirada não poderia ser tão
abrupta. Era preciso o acompanhamento de psicólogos ou assistentes sociais para trabalhar essa
questão com as crianças, mostrar
que uma casa precisa ter banheiro, por exemplo", afirma ele.
Segundo os meninos I. e L., ambos de 13 anos, por volta das 10h
de ontem "muitos homens da
prefeitura" chegaram ao local.
"A gente correu para dentro da
casinha e pediu para levarem a
gente junto. Mas o "tio" mandou a
gente sair", disse um deles. "Enquanto eles levavam as casinhas,
começamos a jogar um monte de
pedras neles", disse I.
De acordo com eles, a ação foi
violenta. "Um dos homens apertou meu braço forte para eu largar
a pedra", conta L., apontando um
pequeno machucado no braço esquerdo. Os dois dizem ter chorado muito. "É claro que eu vou
chorar. A casinha era boa, tinha
colchão e cobertor, cabiam até
três pessoas apertadas", diz I.
A associação não sabia o que fazer com os meninos. Ontem, eles
dormiram na casa de bonecas que
fica na entrada, do lado de dentro
do portão da associação. Mas foi
uma situação improvisada, já que
não há funcionários que fiquem
no local nesse horário.
O subprefeito disse que irá apurar a acusação de que a retirada
foi feita de forma violenta. A Folha tentou ouvir o prefeito ontem
à tarde, mas sua assessoria informou que o secretário Pesaro é que
deveria falar sobre o caso.
Próximo Texto: Exclusão social: Para Serra, dar "casinha" é solução absurda Índice
|