São Paulo, quarta-feira, 03 de agosto de 2005

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EXCLUSÃO SOCIAL

Secretário diz que irá encaminhar crianças às famílias ou a abrigos; para ele, entidade deve propor parcerias

Para Serra, dar "casinha" é solução absurda

DA REPORTAGEM LOCAL

A Prefeitura de São Paulo tentará descobrir de onde as crianças que moravam nas "casas de bonecas" perto do shopping Tatuapé vieram e se ainda têm família. Segundo o secretário municipal da Assistência e Desenvolvimento Social, Floriano Pesaro, o objetivo da administração é, primeiro, tentar levá-las de volta ao antigo lar. Se isso não for possível, elas serão encaminhadas a um abrigo.
As duas casas em que três crianças viviam foram retiradas ontem pela Subprefeitura da Mooca. Os meninos, porém, continuaram na rua. As moradias foram instaladas pela Associação Casa da Criança de Nossa Senhora Aparecida nesse local. Uma casinha em Aricanduva (zona leste da cidade) também foi retirada.
"Pensamos em dar uma bolsa do Peti [Programa de Erradicação do Trabalho Infantil] às famílias dessas crianças. Faremos o diagnóstico e depois decidiremos o que fazer", diz o secretário.
De acordo com ele, a entidade não deveria ter atuado dessa maneira. "Faço um apelo para que façamos um trabalho articulado, de parcerias", diz.
Ele disse que foram criadas 6.700 vagas em albergues em sete anos e que, neste ano, na operação de inverno da prefeitura, mil vagas surgiram. Para as crianças, foram criadas 145 vagas -além das 700 já existentes.
O prefeito José Serra (PSDB) disse ontem que acha um "absurdo completo" a iniciativa da Associação Casa da Criança Nossa Senhora Aparecida de disponibilizar pequenas casas feitas de madeira com teto de zinco para os moradores de rua da cidade.
"Botar casinha de cachorro para morador de rua ficar é querer perpetuar a condição desse morador. É uma solução absurda e que a prefeitura não vai permitir."
Serra disse que os moradores de rua devem procurar os albergues da prefeitura, onde terão bom atendimento e orientação adequada, voltada a um trabalho de recuperação.
O prefeito afirmou ainda que não discute as intenções da associação, mas acha que o resultado é desastroso. Ele lembrou que saiu em uma madrugada fria para conversar com os moradores de rua e, dos cinco que ele abordou, apenas um quis ir ao albergue.
"Se você colocar casinha para eles ficarem, eles não sairão nunca mais. E é um prejuízo para eles próprios, evidentemente, pois casinha de cachorro é para cachorro, e não para ser humano."

Investigação
O promotor de Justiça da Infância e da Juventude, Eduardo Dias de Souza Ferreira, diz que irá averiguar se a entidade agiu de forma irregular ao doar as casinhas.
"A princípio, não gostaria de dizer se o que eles fizeram foi certo ou errado. A gente tem que ver o contexto como um todo. As casinhas não são adequadas e o poder público as desmanchou. Mas a pergunta é: tirando as casinhas, o que foi oferecido para preservar a dignidade dessas crianças?"
Segundo ele, a entidade poderia ter ajudado as crianças encaminhando-as para um serviço de abrigo ou denunciando a situação delas para o Conselho Tutelar. "Essa história traz à baila de uma forma bem chocante essa questão social", diz o promotor.
O padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Menor, diz que amanhã será realizada uma reunião entre diversas entidades que atuam com moradores de rua para propor sugestões de habitação para a prefeitura.
"Não queremos promessas. Queremos um cronograma." (AFRA BALAZINA, RENATA BAPTISTA E AMARÍLIS LAGE)

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