São Paulo, quarta-feira, 03 de novembro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CÓDIGO GENÉTICO

Banco público, coordenado pela Faculdade de Medicina da USP, já coletou 33 amostras de pais cujos filhos sumiram

DNA agiliza busca de criança desaparecida

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Um banco público de DNA é a nova arma da polícia e de pesquisadores na busca por crianças e adolescentes brasileiros desaparecidos. Só no Estado de São Paulo, ocorrem por ano 8.300 casos, o equivalente a 43% do total de desaparecimentos. No Brasil, esse número chega a 30 mil.
Em um mês de funcionamento, o banco, coordenado pela FMUSP (Faculdade de Medicina da USP de São Paulo), coletou 33 amostras de DNA de pais que deram queixa do desaparecimento dos filhos nas delegacias da capital. O DNA (ácido desoxirribonucleico) reúne os elementos genéticos que identificam cada ser humano. É extraído a partir de uma gota de sangue ou da saliva.
A análise do DNA dos pais gera um perfil que é inserido em um banco de dados. Toda vez que uma criança sem filiação for achada, uma amostra do DNA também vai para o banco. Assim, as informações são cruzadas.
Segundo a médica Gilka Gattás, chefe do departamento de medicina legal da FMUSP e coordenadora do projeto, se não for encontrada nenhuma compatibilidade, o DNA fica arquivado. Sempre que um pai -ou uma criança- entra no sistema, automaticamente os dados são cruzados.
O laboratório conta com um seqüenciador automático de DNA, avaliado em R$ 1 milhão, que foi doado por uma empresa de tecnologia. Ele permite a análise de 2.000 amostras de material genético por semana. Os materiais necessários para realizar o exame e os custos do processo serão bancados pelo governo do Estado.
A equipe aguarda agora a autorização da Corregedoria do Estado para colher amostras de DNA de crianças que vivem em abrigos públicos. Só no Estado de São Paulo, há 3.900 crianças, sem vínculo familiar, nesses locais.
Segundo Gattás, até hoje a localização das crianças normalmente acontece quando alguém as identifica por fotos. O problema é que, quando o desaparecimento já dura mais de dez anos, o reconhecimento é dificultado pela mudança de fisionomia. A genotipagem otimizaria o processo com 99,9% de chances de acerto.
A médica lembra que o banco de DNA vai evitar que as famílias sejam chamadas várias vezes para a identificação, ou que tenham que se deslocar para outras cidades ou Estados para fazê-lo.
Para Ivanise Esperidião da Silva, presidente da ABCD (Associação Brasileira de Busca e Defesa a Crianças Desaparecidas), é fundamental que o banco seja estendido a outros Estados para evitar que as famílias se desloquem.
Ela própria, que tem uma filha desaparecida há nove anos, já viveu essa situação inúmeras vezes. "Toda vez que aparece uma notícia, cria-se uma expectativa muito grande. Quando se trata de um alarme falso, vira um misto de frustração, revolta, impotência e inconformismo", conta Ivanise.
Segundo ela, muitas famílias não têm condições financeiras para arcar com os custos dessas viagens. A ABCD tem um arquivo com 5.000 casos de desaparecimentos infanto-juvenis.
Gattás afirma que o projeto começou no Estado de São Paulo, mas há perspectiva de ampliá-lo para todo o país. Não há, entretanto, prazo para isso acontecer.
Ivanise considera fundamental também a criação de um cadastro nacional de desaparecidos e que, a partir disso, haja comunicação entre as polícias estaduais.
De acordo com o delegado Antonio Mestre Júnior, da divisão de proteção à pessoa, do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), mesmo sem essa rede os policiais paulistas trocam informações com outros Estados.
Para ele, é preciso que o banco de DNA seja estendido à população adulta desaparecida -cerca de 11 mil por ano. O número de pessoas desaparecidas achadas mortas no país gira em torno de 10% do total de casos registrados.
A maior parte dos desaparecimentos infanto-juvenis é de adolescentes entre 14 e 18 anos e, em geral, provocada por conflitos familiares, afirma Mestre Júnior.
É nessa faixa etária que há também o maior índice de localização de desaparecidos: 73%. Entre os adultos, a taxa é de 66%.


Texto Anterior: Trânsito: Retorno a SP após feriado é tranqüilo
Próximo Texto: Em busca da filha: "É uma ferida aberta que sangra", diz mãe
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.