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São Paulo, quarta-feira, 03 de dezembro de 2003

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URBANIDADE

A escola das cinzas

GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA

Um projeto de salvação de uma escola pública nasceu numa despretensiosa festa e acabou virando, segunda-feira, uma referência nacional.
Ex-alunos da escola estadual Antônio Alves Cruz, em Pinheiros, resolveram fazer, em 2000, um jantar para se divertir e lembrar os velhos tempos de adolescentes. A alegria se desfez quando eles, todos com mais de 40 anos, resolveram visitar, antes da festa, a escola.
Nada fazia lembrar os velhos tempos, quando havia aulas de teatro, oficinas de fotografia, ateliês de arte, debates políticos e literários, numa efervescência típica dos anos 60 e 70. Com aquele nível educacional, não surpreenderia que Zyun Masuda, então estudante do Alves Cruz, pudesse entrar no concorrido curso de Medicina da USP, apesar de ser de uma escola pública. "Chegamos a ter brigas feias, quase saindo no braço, por causa de Capitu, quando discutíamos o livro Dom Casmurro", lembra Masuda.
Atônitos, eles viram a lembrança caindo aos pedaços. Paredes e muros pichados, salas vazias, laboratórios abandonados, em meio ao rodízio de desesperançados diretores e professores. Souberam que o governo estadual planejava fechá-la, por falta de alunos.
Aproveitaram a festa para, em vez de lembrar velhos tempos, planejar novos tempos. Criaram a Associação Fênix - referência ao pássaro mitológico que ressurgia de suas próprias cinzas. "Sentia-me em dívida com a escola. Não fosse o Alves Cruz, não teria chegado onde cheguei", diz Masuda, indicado presidente da associação. Até chegar naquela escola, ele nem sequer falava português direito.
Levantaram recursos para reformar o prédio, implantaram programas extracurriculares de artes, esportes e informática. Chamaram o Ballet Stagium para ensinar dança. Fizeram parcerias com faculdades da Universidade de São Paulo para capacitar os professores.
Duplicou o número de alunos, atraídos pela qualidade de ensino -e se afastou o risco de fechamento do Alves Cruz. Nesta segunda-feira, veio o reconhecimento nacional. A Associação Fênix foi escolhida pelo prêmio Itaú-Unicef, entre 1.824 projetos brasileiros, uma das dez mais interessantes experiências para melhorar a educação pública.


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