São Paulo, terça-feira, 04 de março de 2008

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Teste para tratar rio Pinheiros vai atrasar

Experimentos com tratamento por flotação deveriam acabar em fevereiro, mas se estenderão até agosto, segundo a Promotoria

Controversa, tecnologia forma flocos de poluição, que são depois removidos; custo para aplicar o método no rio Pinheiros é de R$ 350 milhões

MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA

Vai demorar pelo menos mais seis meses para saber se o sonho de ver as águas do rio Pinheiros mais claras tem futuro. O teste do controverso sistema de flotação, previsto para se encerrar no final de fevereiro a um custo de R$ 23 milhões, durará pelo menos até agosto.
A informação é do Ministério Público do Estado de São Paulo. Se tudo der certo, o sonho fica para 2012 ou 2013.
O atraso ocorreu por problemas operacionais nos testes, que começaram em setembro. Chuvas intensas e acúmulo de lixo danificaram equipamentos e fizeram o processo ser interrompido em várias ocasiões -os testes são necessários para fazer o estudo de impacto ambiental exigido para aplicar o tratamento por flotação em todo o rio.
A novela da flotação no Pinheiros já dura quase uma década. Trata-se de tecnologia comprovada para clarear águas -por exemplo de mineração, ou mesmo esgotos. É usada desde 1998 no pré-tratamento do rio Tâmisa, em Londres, antes da filtração.
Em São Paulo, já é empregada, por exemplo, nos parques da Aclimação e Ibirapuera.
Nada se compara, porém, ao projeto do Pinheiros, com custo estimado em R$ 350 milhões. Primeiro, pela quantidade de água: 50 metros cúbicos por segundo -uma piscina de 5 m de cada lado por 2 m de profundidade, ou 50 mil litros.
Segundo, porque uma flotação desse porte nunca foi tentada, no mundo, num sistema em fluxo. Ou seja, direto num curso d'água, sem o ambiente controlado de tanques.
Não é muito diferente do processo de floculação, para limpar piscinas (veja quadro). Produtos químicos reúnem a sujeira (partículas sólidas em suspensão) na forma de flocos, que são forçados para cima com a ajuda de microbolhas de ar.
Uma espécie de lodo se forma na superfície, e não no fundo, como numa piscina. Seria complicado aspirar o fundo de um rio. Mais prático é separá-lo -como a nata do leite- com rodas coletoras, para ser depois tornado inerte com cal (que mata microorganismos).
Na prática, é mais fácil falar que fazer. A flotação encontrou resistência, desde que surgiu, por causa de dúvidas sobre sua capacidade de despoluição. Afinal, suas águas, após flotadas, irão para a represa Billings.
O reservatório é cada vez mais importante para a região metropolitana, que não tem mais onde buscar água. O sistema Cantareira, ao norte, supre metade da população, mas já sofre os efeitos da expansão urbana de Mairiporã. A bacia que o alimenta tem só 20% de cobertura florestal (que funciona como uma esponja, evitando escorrimento das águas).
Em alguns anos ou décadas, o sistema Cantareira poderá estar poluído por esgotos, como ocorre hoje com a Guarapiranga. Essa represa, junto à Billings, recebe parte de sua água do braço Taquaquecetuba da vizinha. Se a flotação piorar a qualidade da Billings, acabará afetando a Guarapiranga.
Com limitações para esses três mananciais mais importantes, que ainda sofrerão a pressão urbanizadora do futuro Rodoanel, restaria a São Paulo buscar água em bacias mais distantes, como o Ribeira de Iguape (sul do Estado). Só as grandes empreiteiras considerariam racional ir tão longe.
A Billings não foi criada para fornecer água potável, mas sim eletricidade. Projetada a partir da década de 1920, suas águas serviram até 1989 para movimentar as turbinas da usina hidrelétrica Henry Borden (Cubatão), após despencar 720 m em tubulações na serra do Mar.
Para isso, o Pinheiros precisava ter seu curso invertido. A água, em vez de seguir da serra para o Tietê, era bombeada no sentido contrário. A Constituição estadual proibiu a inversão do rio em 1989. Interrompeu-se com isso o lançamento na Billings das águas poluídas do Pinheiros, dos córregos que o alimentam e do próprio Tietê. A única exceção são chuvas torrenciais, quando se faz a inversão para controlar enchentes.
A flotação, para os engenheiros da Emae (Empresa Metropolitana de Águas e Energia), permitiria aproveitar melhor a Henry Borden. Com o acréscimo de 50 m3/s, a usina passaria a gerar cerca de 400 megawatts -o suficiente para 1,5 milhão de casas, o que ajudaria a pagar a conta da flotação.


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