São Paulo, sexta, 4 de abril de 1997.

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OPINIÃO
Um golpe surrealista contra a saúde

EDMUNDO CASTILHO

A lei 9.495/97, que visa -à revelia da lógica e de outras legislações- a normalizar os planos de assistência médica e seguro-saúde em São Paulo, é equivocada. Por seus aspectos surrealistas, não é adequada à regulamentação da abrangência, limites e carências dos planos.
Em primeiro lugar, a lei desconsidera que a composição dos custos baseia-se numa ciência exata chamada atuária. Os componentes são facilmente demonstráveis, em planilhas apresentadas regularmente aos órgãos de Defesa do Consumidor.
São levianas as declarações, feitas sabe-se lá a serviço de que interesses, de que os lucros das "promotoras" são exorbitantes e que a revogação de limites, carências e exclusões é suportável.
A maioria das promotoras -devido ao congelamento das mensalidades e do aumento desproporcional dos medicamentos, hospitais e outros insumos- está em desequilíbrio financeiro. Além disso, a inadimplência é alarmante. Também é leviano defender a retroatividade da lei. A relação custo-benefício não pode ser desrespeitada em razão de "achismos", que levam a mudanças das regras de modo irresponsável e maldoso, por visarem à quebradeira do setor.
As intervenções do Estado devem ter prévios e criteriosos estudos jurídicos, constitucionais e atuariais. Desconsiderá-los é subverter a ordem natural, gerando desequilíbrios financeiros capazes de inviabilizar muitas promotoras. Se isso ocorrer -considerando a crise do Sistema Único de Saúde (SUS)-, estará instalado o caos na assistência médico-hospitalar.
A lei, de iniciativa do Legislativo e sancionada pelo governador Mário Covas, também contraria outros dispositivos legais: a medida provisória que criou o real dá ao mercado a prerrogativa de se auto-regular; o Código de Defesa do Consumidor estabelece condições para o cidadão defender-se. Quando o brasileiro aprender a usá-lo, o Estado será mais responsabilizado, cível e criminalmente, por suas intervenções em áreas sensíveis e vitais.
A intromissão do Estado nos planos de saúde atropela o Código Civil e o de Defesa do Consumidor. Esse equívoco causa prejuízos materiais, de um lado, e até danos físicos e mentais, do outro. Tal ato pode ser objeto de ações judiciais de ressarcimento e reparação.
Por tudo isso, dificilmente essa violência representada pela lei 9.495/97 irá prosperar. O Judiciário haverá de, a curto prazo, proferir sentença definitiva, caracterizando a inconstitucionalidade e ilegalidade dessa teratológica medida.


Edmundo Castilho, 67, médico, é presidente da Unimed do Brasil.

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