São Paulo, sexta-feira, 04 de maio de 2001

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Coveiros se negam a levar caixão e atrasam enterro

Antônio Gaudério/Folha Imagem
Jessé Cândido de Oliveira, funcionário do cemitério, conduz o caixão de Marcelo dos Santos até o local onde seria enterrado


DA SUCURSAL DO RIO

O caixão onde estava o corpo de Marcelo Melo Gonçalves dos Santos permaneceu sob o sol durante 22 minutos porque os funcionários do cemitério São Francisco Xavier (Caju, zona norte) não quiseram levá-lo ao túmulo. Nenhum parente assistiu ao enterro.
A recusa dos funcionários teve o significado de um protesto. Eles não carregaram o caixão porque julgam que Santos, 37, cometeu um crime bárbaro -o estupro e o assassinato da fonoaudióloga Márcia Maria Castro Lira.
Somente um empregado do cemitério, o capeleiro Jessé Cândido de Oliveira, 40, se dispôs a levar o caixão até a gaveta. Denunciado pela própria mulher, Erinalva Barbosa, 42, Santos foi preso um dia depois do crime e na última segunda-feira apareceu morto por enforcamento na sala da Polinter (Polícia Interestadual).
Ontem, Jessé Oliveira conduziu o carrinho onde estava o caixão por cerca de 500 metros, pelas vielas e alamedas do cemitério, mas esbarrou em uma dificuldade: para chegar à gaveta, teria que subir os 20 degraus de uma escada. Sozinho, não conseguiria carregar o caixão nas costas.
"Ninguém merece isso, por mais que seja ruim. Tinha que vir alguém da família. Um filho, a mulher. O pessoal daqui não ajuda porque sabe quem é a pessoa.Todo mundo se afasta", disse o capeleiro. Oliveira trabalha há dois anos no cemitério. Por dia, participa de cerca de 50 enterros. "Nunca vi, em nenhum outro enterro, um cadáver tão abandonado como o deste criminoso."
Sem saber o que fazer para cumprir sua tarefa funcional, Oliveira chegou a pedir ajuda aos cerca de 30 jornalistas que acompanhavam o sepultamento. "Alguém de vocês poderia dar uma força?", perguntou. Todos se recusaram. Alguns riram e debocharam.
A situação só foi contornada às 12h12 (22 minutos de o caixão ter chegado ao pé da escadaria), quando Oliveira já começava a dar sinais de desespero.
Muito suado e incomodado pelo cheiro ruim que exalava do cadáver, insepulto há três dias, o capeleiro acenava as mãos para os colegas. Dois coveiros, a contragosto, resolveram ajudá-lo.
"Vamos acabar logo com isso e enterrar esse demônio", afirmou um deles. (ST)


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