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DANUZA LEÃO
A vida a dois
E os amigos? A mulher implica com os dele, e ele
com os dela, o que é um dos problemas do casamento
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O GRANDE problema da vida é
que, mesmo quando duas
pessoas são muito próximas,
uma delas quer, com freqüência,
exatamente o oposto do que quer a
outra -e isso nos mais variados
campos.
A mãe quer que o filho vá para a
cama às dez horas -razão suficiente
para que ele queira ir às três da manhã. E como resolver esse problema,
a não ser usando da autoridade no
que ela tem de mais antipático e antidemocrático? Ponderar, explicar
que a aula no dia seguinte começa
cedo, tentar entrar num acordo, é
apenas uma ilusão; cada um quer fazer o que quer e bem entende, e ceder, em nome do bom senso e da civilidade, deixa uma das partes -a
que cede- de péssimo humor. Com
toda a razão, aliás.
Existe coisa mais insuportável do
que ir ver o filme que o namorado
quer quando a vontade é ver um outro? Jantar no restaurante que o
amigo escolheu, fazer a viagem que o
marido achou mais interessante, na
época que ele decidiu ser a melhor?
Mas para não ficar só é preciso ceder, e geralmente quem cede é sempre o mesmo -uma grande injustiça, aliás.
A marca e a cor do carro, o bairro
onde vão morar, o tipo de comida
que a empregada faz, as frutas que
são compradas na feira, tudo costuma ser decidido sempre pelo gosto
de um dos dois -e o outro que se habitue. Só num ponto não há acordo:
quem não gosta de alho não vai tolerar, jamais, que o outro chegue em
casa com a prova do crime cometido
no almoço; este é um tema sem nenhuma esperança de solução.
E os amigos? A mulher costuma
implicar com os dele, e ele com os
dela, o que é um dos grandes problemas do casamento. Mas como estão
os dois apaixonados e dispostos a
qualquer coisa para que dê certo, cada um cede -olha aí a palavra de novo- um pouco; um dia saem com os
dela, no outro com os dele, o que significa que sempre um vai estar com
um certo mau humor quando chegar em casa -mas tudo pelo amor.
Ah, mas por que não se pode fazer
apenas o que se quer? Poder até pode, mas para isso é preciso abrir mão
de um marido, namorado ou caso
-o que tem sido, aliás, a escolha de
muita gente, nos últimos tempos.
Mas será esta a solução?
Às vezes é ótima; não ter que dividir o controle remoto da televisão
com ninguém -convenhamos- é
uma grande felicidade. Mas como
seria bom também ter com quem ir
ao cinema e depois sair comentando, trocando uma idéia, parar num
bar e tomar um chope, comer uma
pizza e sentir que faz parte da humanidade, digamos, normal.
Porque, com todas as vantagens,
quem escolheu ficar só se sente muitas vezes um estranho no ninho, seja
entrando numa festa, seja saindo,
seja sentado sozinho no restaurante
observando os casais das outras mesas, juntos -mesmo que, grande
parte das vezes, se você reparar bem,
eles estão mais sós que você.
São muitas as vantagens de uma
solteirice assumida; mas às vezes,
numa tarde de sábado, batem uns
sentimentos que contrariam essa
escolha tão duramente feita. E nessas horas você pensa: ah, como seria
bom estar com alguém, mas de verdade mesmo. Como seria bom.
Aí você passa em revista os amigos, todos os homens por quem poderia eventualmente ter algum interesse, e se pergunta: será que eu gostaria de estar com algum deles aqui
comigo, agora?
E se a resposta for um não convicto, talvez seja a hora de reconhecer
que algumas pessoas nasceram para
serem sós, e que você -feliz ou infelizmente- é uma delas.
Ou, pensando melhor: será que
não somos, todos nós, uma grande
multidão de solitários?
danuza.leao@uol.com.br
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