São Paulo, quinta-feira, 04 de julho de 2002

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INFÂNCIA

Justiça determinou desativação de unidade, após denúncias de maus-tratos; local será usado como penitenciária

Governo fecha unidade "problema" da Febem

BRUNO LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL

Depois de duas sentenças determinando o fechamento da Febem de Parelheiros (zona sul de São Paulo), a unidade de segurança máxima, que era apontada como irregular antes mesmo de sua inauguração, foi desativada ontem, quando os últimos 18 internos deixaram o local.
Segundo a Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor), dos 301 internos, 39 foram liberados e 262 foram transferidos para as unidades de Franco da Rocha, Raposo Tavares, Tatuapé, São José do Rio Preto, Campinas, Ribeirão Preto e para internatos descentralizados.
Pelo menos três dessas unidades -Franco da Rocha, Raposo Tavares e Tatuapé- são consideradas inadequadas por entidades de defesa da criança e do adolescente. "Franco da Rocha é um grande presídio. Sair de Parelheiros para lá é trocar seis por meia dúzia", disse Wilson Tafner, promotor da Infância e Juventude. Segundo o coordenador da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, João José Sady, há suspeitas da existência de uma sala de tortura na unidade de Franco da Rocha. A Febem nega.
O Ministério Público Estadual apura outras denúncias de tortura na unidade. A Febem informou que foi uma briga a origem da denúncia. Segundo a assessoria da entidade, um funcionário teria agredido um interno em 18 de junho e sido demitido por justa causa no dia 26, após sindicância.
Conceição Paganelli, 47, presidente da associação de mães da Febem, conta que tem recebido reclamações das três unidades. "Raposo Tavares, Franco da Rocha e Tatuapé são um terror."
A Pastoral do Menor diz ter recebido, no início desta semana, denúncias de maus-tratos na unidade Raposo Tavares. Funcionários estariam batendo em menores com agressões que não deixam marcas, principalmente pancadas na sola do pé. A Febem disse que não foi informada de nenhuma irregularidade na unidade e que, havendo denúncias, elas serão investigadas.
Em abril, foi encontrada uma sala de tortura em Parelheiros. Poucos dias depois, a Febem afastou oito funcionários da unidade.
"Não compactuamos com violência. Quando há um caso de denúncia, isso é rigorosamente apurado, é aberta sindicância e o funcionário é demitido", disse o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. "A orientação é reeducar, e a Febem está tendo sucesso nesse trabalho."
Por volta das 14h30 de ontem, em cerimônia em Parelheiros, a presidente da Febem, Maria Luiza Granado, entregou as chaves da unidade ao governador, que as repassou para o secretário de Estado da Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa. O local voltará a ser um presídio. A adaptação, segundo o secretário, deve custar cerca de R$ 150 mil.
A desativação está entre as medidas chamadas pelo governo de descentralizadoras e regionalizadoras da Febem. A idéia seria a de utilizar unidades menores, mantendo o adolescente o mais próximo possível de sua família. Segundo Alckmin, ontem foi um dia "histórico", em que o governo cumpriu o compromisso assumido de fechar a unidade. "Parelheiros era uma das unidades que estavam fora do novo contexto. Demos mais um passo para reeducar o nosso adolescente."
Segundo o governador, antes da implementação do novo programa de trabalho dos jovens que saíam da Febem, 30% voltavam a cometer ato infracional. "Isso foi reduzido para 6%", afirmou Alckmin, que também citou ações de educação para o trabalho.
A primeira sentença que condenou a Febem, expedida em 4 de março deste ano, em um processo iniciado na época da inauguração de Parelheiros, determinou a retirada dos adolescentes no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000 por interno mantido na unidade. A decisão, da juíza Maria Olívia Alves, da Vara da Infância e Juventude de Santo Amaro, afirma que a administração "ainda não mostra vontade efetiva de ver pelo menos diminuídas as situações violentadoras da infância e da adolescência".
A sentença ainda não transitou em julgado, mas não teve seus efeitos suspensos pelo Tribunal de Justiça, que ainda precisa julgar o recurso de apelação.
A segunda decisão, de 25 de junho de 2002, da juíza Mônica Paukoski, do Departamento de Execuções da Infância e da Juventude, além de determinar o fechamento da unidade em 45 dias, ordenou o afastamento de dois dirigentes, o que já foi feito pela entidade. Ainda cabe recurso da sentença, mas, se for mantida a decisão, os dois funcionários não poderão mais ocupar cargos de direção na Febem.
O Comitê Febem, formado por entidades como o Grupo Tortura Nunca Mais, a Fundação Abrinq e a Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, reúne-se amanhã para discutir a fiscalização de unidades da Febem.



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