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ARTE E VIDA
Para médica, doentes não cogitam abreviar a vida quando há bons cuidados paliativos
Paciente grava poesias e presenteia colegas
DA REPORTAGEM LOCAL
Com câncer na próstata em
evolução e metástase nos ossos,
o aposentado Manir de Godoy,
76, é um exemplo de que é possível ter qualidade de vida mesmo
diante de uma doença incurável.
Há mais de um mês ele ocupa
um dos seis leitos da enfermaria
de cuidados paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual,
em São Paulo, um dos pioneiros
no país a realizar esse tipo de trabalho, que o Cremesp pretende
incentivar.
Assim como Godoy, os outros
portadores de doenças incuráveis recebem oxigênio, soro, radioterapia e remédios para evitar a dor. Não são feitos procedimentos invasivos nem reanimação cardíaca, por exemplo.
Mesmo com um braço quebrado devido à fragilidade óssea
motivada pela doença, ele grava
poesias de autores famosos para
os outros pacientes. "Qual é o
brasileiro que não é poeta?", desconversa, quando indagado se
também escreve poemas.
Godoy pretende criar um departamento de arte no hospital,
que ajude os pacientes a encarar
melhor a doença. "Dostoievski
[Fiodor Mikhailovitch Dostoievski, 1821-1881, escritor russo] era epilético e não se abatia. É
claro que não dá para comparar
minha doença com a dele. Mas
me miro no exemplo desses
grandes homens. A arte foi
maior que a doença."
Antes de se internar na enfermaria do hospital, Godoy já era
atendido em casa por uma equipe de profissionais do local
-outros cem doentes contam
com esse serviço atualmente.
A médica Maria Goretti Maciel, idealizadora do trabalho,
afirma que os cuidados paliativos trazem dignidade ao doente
terminal. Para ela, quando existe
um bom trabalho nessa área, os
pacientes nem cogitam abreviar
a vida (eutanásia). "Nesses últimos cinco anos de trabalho, com
mais de mil pacientes atendidos,
só uma senhora quis se abster de
procedimentos que lhe dariam
um ou dois meses de vida."
Para ela, deixar o paciente terminal numa UTI, longe da família, só aumenta o sofrimento.
"Um paciente fora de possibilidade de cura não é um doente
fora de possibilidade de vida."
A família também recebe
apoio psicológico durante o processo e após a morte do paciente.
O hospital Emílio Ribas e o
Hospital do Servidor Público
Municipal, ambos de São Paulo,
também mantêm serviço de cuidados paliativos. Nesse último,
os doentes são tratados em uma
ampla casa na Aclimação (zona
sul da capital).
No início do ano, os paliativistas, como são chamados os profissionais que atuam com cuidados paliativos, criaram a Academia Nacional de Cuidados Paliativos, que luta para que a atividade seja reconhecida como especialidade médica.
Na opinião de Maciel, é fundamental que as escolas de medicinas ensinem a aliviar a dor física,
psíquica, social e espiritual do
doente terminal.
(CC)
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