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EDUCAÇÃO
Entidade internacional adota critérios étnicos ao selecionar candidatos ao financiamento de estudos de pós-graduação
Bolsas da Fundação Ford priorizam negros e índios
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
Uma mudança nos critérios da
Fundação Ford para concessão de
bolsas de pós-graduação pode fazer da índia Maria das Dores Oliveira, 37, da etnia pankaru, a primeira representante da população indígena a conseguir um título de doutorado no país.
Ela foi um dos 42 candidatos selecionados para ganhar uma bolsa de mestrado ou doutorado na
primeira vez em que a Ford adotou, no Brasil, critérios de ação
afirmativa.
A mudança nos critérios da entidade, tradicional financiadora
de bolsas, fez com que, dos 42 escolhidos, mais de 90% fossem negros, pardos ou indígenas. Esses
grupos étnicos representam
45,7% da população brasileira,
mas apenas 16,7% dos formandos
de nível superior, segundo o IBGE
e o Ministério da Educação.
Maria nasceu numa aldeia de
índios pankaru, no interior de
Pernambuco. Ela tem dois cursos
de graduação (história e pedagogia) e um mestrado em linguística, e ganhou a bolsa para um doutorado na mesma área, na Universidade Federal de Alagoas.
A chefe do Departamento de
Educação da Funai (Fundação
Nacional do Índio), Maria Helena
Sialho, e a representante da comunidade indígena no Conselho
Nacional de Educação do MEC,
Francisca Novantino Pinto de
Ângelo, dizem não haver registro
de índio com título de doutor
atualmente no país.
Sobrinha de um cacique e de
um pajé, Maria conta que o fato
de as mulheres de sua aldeia sempre terem tido voz na comunidade ajudou-a a prosseguir nos estudos, com o apoio dos pais.
"Meu trabalho sempre foi voltado para minha comunidade. Pretendo estudar as línguas indígenas, com o objetivo de não deixá-las morrer completamente ou, ao
menos, não morrer sem registro."
A bolsa da Ford também ajudará a estudante de mestrado Adriana Freire Pereira, 24, a ser uma exceção nas estatísticas de negros na
pós-graduação no Brasil.
Ela começou a vida escolar da
forma menos promissora possível. Aos 7 anos, trabalhava na roça
e levava água para os pais e os 11
irmãos, no interior da Paraíba.
Caminhava cerca de sete quilômetros por dia.
A família se mudou para um local próximo a uma escola, e
Adriana foi tomando gosto pelos
estudos. Graças ao esforço pessoal e à ajuda de amigos e parentes, foi passando por todos os níveis de ensino até se formar em
serviço social na Universidade Estadual da Paraíba.
A bolsa da Ford ajudará Adriana a concluir o mestrado em sociologia pela Universidade Federal da Paraíba. O salto de uma geração para outra na família é
imenso: seus pais não completaram quatro anos de estudo e seu
irmão mais velho é analfabeto.
"Meu irmão sempre me incentivou, dizendo que eu tinha de estudar porque ele sofreu muito por
ser analfabeto", conta Adriana.
A coordenadora do programa
de bolsas da Ford no Brasil, Fulvia
Rosemberg, diz que o salto entre
gerações é uma característica comum em quase todos os candidatos. "A mobilidade social de uma
geração para outra é espantosa."
Ana Cristina de Souza, 37, militante do movimento negro no
Rio, também foi beneficiada. Ela
considera a militância fundamental para ter prosseguido nos estudos até chegar ao mestrado.
"A partir da militância, tudo o
que eu desejava, e acreditava não
ser possível, como frequentar um
curso superior, tornou-se meu
objetivo", afirmou.
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