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Um ano após acidente, pai relembra filha em livro
Colisão causada por consumo de álcool matou 5 jovens
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Para atenuar uma dor intraduzível em palavras, o arquiteto Gustavo Padilla se apoiou
nelas, as palavras. Ontem, exatamente um ano após ver o corpo de sua filha Ana Clara no
canteiro central da av. Borges
de Medeiros, na Lagoa (zona
sul do Rio), ele lançou "Relato
de um Amor" (Nova Fronteira,
160 págs., R$ 25), livro em que
expõe os estragos causados pelo acidente que matou cinco jovens de classe média alta.
Ana Clara, 17, estava no banco do carona do carro dirigido
pelo namorado, Ivan, 18. No
banco de trás, estavam Manoela, 16, e Joana, 17, além de Felipe, 22. Logo após saírem de
uma boate, às 5h40, o carro se
desgovernou, a 110 km/h, capotou várias vezes e bateu numa
árvore. Os cinco morreram.
"Você acordar e sentir que
não tem mais um filho é uma
devastação. Falta alguém em
você todo dia de manhã", diz
ele, pai de outros três filhos.
Padilla, 54, resolveu enfrentar situações dolorosas. Escreveu todo o livro no quarto de
Ana Clara. "Foi como se ela ainda estivesse comigo, me ajudou
muito." Ao lado da mulher e
dos pais de Manoela e Joana,
cuida do canteiro que cerca a
árvore que selou a morte das
amigas -representadas por
três orquídeas. Ontem, atletas
do Vasco, cuja sede náutica fica
em frente, fizeram uma oração
no local. A prefeitura anunciou
que criará ali uma praça.
Para o arquiteto, os nove meses de trabalho no livro ("a gestação de minha filha às avessas", como escreve) o ajudaram
a relativizar a sensação de que
poderia ter feito algo para impedir a morte da filha.
Ele orientava Ana Clara a não
andar com um motorista que
tivesse bebido. Ela não tinha álcool no sangue, como mostrou
a necropsia, tinha pedido um
táxi, mas acabou entrando no
carro do namorado.
Livre-arbítrio
"Hoje penso que fiz o máximo que pude. Mais, só se a trancasse dentro de casa, e não é assim que funciona. Da porta de
casa para fora, é o livre-arbítrio.
Minha filha teve o livre-arbítrio
para estar naquele carro. Nessa
hora, você espera que o Estado
esteja presente. Porque nenhum pai pode ser onisciente."
"Algumas ações começaram
a ser feitas, até em razão desse
acidente. Mas ainda são tênues.
Talvez a Justiça tenha que fazer sua parte. É um absurdo um
jovem dirigir embriagado e se
recusar a usar o bafômetro. Ele
tem que saber que vai passar
um dia ou uma noite na cadeia,
não importa se é filhinho de papai", afirma.
Apesar do tom, Padilla procura não culpar Ivan. "Era um
bom garoto, de boa índole. Estava ao volante com sua inexperiência, a imprudência dos 18
anos, e também se tornou uma
vítima. Culpá-lo só vai me levar
a mais amargura."
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