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Análise
Fraude não basta para colocar Enem em xeque
HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
A fraude no Enem não basta
para colocar em xeque o modelo da prova. Pelo contrário, ela
demonstra a necessidade de
aprofundá-lo ainda mais.
Embora as circunstâncias do
vazamento apontem mais para
objetivos políticos do que "pedagógicos" -o público natural
para o qual vender resultados
de um teste são os examinandos, não a imprensa-, a segurança da prova precisa cada vez
mais estar no centro das atenções do Inep.
O motivo é muito simples:
quanto mais o Enem se populariza e vai ocupando o espaço
dos vestibulares tradicionais,
maior valor monetário adquire
a sua violação. Uma vaga em
curso de medicina em universidade federal, por exemplo, custaria, em valores de mercado,
algo como R$ 200 mil.
Não seria impossível encontrar pais ansiosos por um médico na família dispostos a pagar
uma fração desse montante pelos resultados do exame. As federais, vale lembrá-lo, são universidades públicas, que não
cobram mensalidades, e cada
vez mais se utilizam do Enem
para selecionar seus alunos, inclusive os de cursos hiperconcorridos como medicina.
A resposta para o problema
está na própria Teoria da Resposta ao Item (TRI), o emaranhado de modelos matemáticos em que se baseia o novo
Enem. É a mesma metodologia
usada em provas já consagradas como o SAT (o Enem dos
EUA) e o Pisa (usado para comparar sistemas de ensino de diferentes países).
A grande vantagem da TRI é
que, por levar em conta o grau
de dificuldade de cada pergunta bem como sua capacidade de
distinguir os alunos mais preparados dos menos, ela permite
comparar estudantes submetidos a provas diferentes. Isso
tem várias implicações. Torna-se possível, por exemplo, avaliar a performance de uma instituição ao longo do tempo.
No caso específico da segurança, a TRI também traz uma
grande vantagem: ela possibilita organizar um exame com várias dezenas de diferentes modelos de prova. Não estamos
aqui falando das mesmas questões dispostas em outra ordem,
mas de testes compostos por
perguntas diferentes. Se existe
apenas uma chance em 50 ou
60 de um candidato a fraudador comprar a prova certa, violações de sigilo praticamente
perdem valor de mercado.
Pode-se ir ainda mais longe e
imaginar uma situação onde
cada examinando resolva seu
teste diretamente num computador. Neste caso, o sistema poderia, a partir do banco de
questões, que idealmente conta
com milhões de perguntas, gerar uma prova específica para
cada candidato.
E isso é provavelmente o
mais perto que se pode chegar
de um exame à prova de fraude.
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