São Paulo, domingo, 04 de outubro de 2009

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Análise

Fraude não basta para colocar Enem em xeque

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A fraude no Enem não basta para colocar em xeque o modelo da prova. Pelo contrário, ela demonstra a necessidade de aprofundá-lo ainda mais.
Embora as circunstâncias do vazamento apontem mais para objetivos políticos do que "pedagógicos" -o público natural para o qual vender resultados de um teste são os examinandos, não a imprensa-, a segurança da prova precisa cada vez mais estar no centro das atenções do Inep.
O motivo é muito simples: quanto mais o Enem se populariza e vai ocupando o espaço dos vestibulares tradicionais, maior valor monetário adquire a sua violação. Uma vaga em curso de medicina em universidade federal, por exemplo, custaria, em valores de mercado, algo como R$ 200 mil.
Não seria impossível encontrar pais ansiosos por um médico na família dispostos a pagar uma fração desse montante pelos resultados do exame. As federais, vale lembrá-lo, são universidades públicas, que não cobram mensalidades, e cada vez mais se utilizam do Enem para selecionar seus alunos, inclusive os de cursos hiperconcorridos como medicina.
A resposta para o problema está na própria Teoria da Resposta ao Item (TRI), o emaranhado de modelos matemáticos em que se baseia o novo Enem. É a mesma metodologia usada em provas já consagradas como o SAT (o Enem dos EUA) e o Pisa (usado para comparar sistemas de ensino de diferentes países).
A grande vantagem da TRI é que, por levar em conta o grau de dificuldade de cada pergunta bem como sua capacidade de distinguir os alunos mais preparados dos menos, ela permite comparar estudantes submetidos a provas diferentes. Isso tem várias implicações. Torna-se possível, por exemplo, avaliar a performance de uma instituição ao longo do tempo.
No caso específico da segurança, a TRI também traz uma grande vantagem: ela possibilita organizar um exame com várias dezenas de diferentes modelos de prova. Não estamos aqui falando das mesmas questões dispostas em outra ordem, mas de testes compostos por perguntas diferentes. Se existe apenas uma chance em 50 ou 60 de um candidato a fraudador comprar a prova certa, violações de sigilo praticamente perdem valor de mercado.
Pode-se ir ainda mais longe e imaginar uma situação onde cada examinando resolva seu teste diretamente num computador. Neste caso, o sistema poderia, a partir do banco de questões, que idealmente conta com milhões de perguntas, gerar uma prova específica para cada candidato.
E isso é provavelmente o mais perto que se pode chegar de um exame à prova de fraude.


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