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MOACYR SCLIAR
Sonhando com homenzinhos verdes
Ao ler no jornal que duas empresas planejavam fazer turismo espacial, achou que viveria a sua aventura
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Boeing planeja levar turistas para o espaço. A empresa de aviação Boeing
anunciou que vai entrar no mercado de turismo espacial. A ideia inicial é que as viagens comecem em
2015, em parceria com a companhia
Space Adventures, responsável pela parte comercial. O preço ainda
não foi definido, mas estima-se que
seja similar ao cobrado pela agência espacial russa, que já faz viagens.
MERCADO, 17.SET.2010
DESDE CRIANÇA era fascinado por
viagens aéreas e viagens espaciais.
Representavam um verdadeiro sonho, um sonho que, de certa forma,
era estimulado pelo pai, que todas
as noites lia-lhe trechos de um livro:
a história de um jovem que constrói
uma espaçonave e desembarca no
planeta Marte, onde é recebido por
homenzinhos verdes que têm na cabeça curiosas antenas.
Homenzinhos verdes com antenas. Ah, se ele pudesse encontrá-los,
se pudesse voar como o jovem herói!
Queria ser piloto e, aos 15, 16 anos,
começou a se informar a respeito.
Começaria pilotando um Boeing,
mas seu objetivo mesmo eram as
viagens espaciais: trataria de conseguir um lugar na Nasa.
Para sua surpresa e desapontamento, o pai não se mostrou nada
favorável. Ao contrário, desaprovou
a ideia de forma categórica e até ríspida. O que até certo ponto era compreensível: seu irmão tinha morrido
num desastre aéreo, e ele não podia
sequer ouvir falar em aviões.
O jovem tentou convencê-lo, afinal tratava-se apenas de uma coincidência, infeliz coincidência, mas
coincidência de qualquer modo. O
homem, porém, manteve-se irredutível: já perdi um irmão, não quero
perder um filho também.
A mãe e a irmã juntaram-se ao
coro, e ele acabou fazendo vestibular para engenharia. Foi aprovado,
claro, era um aluno brilhante. Fez o
curso, formou-se, abriu um escritório e acabou fazendo sucesso na engenharia, ganhando muito dinheiro.
Casou, teve um filho; e para o garoto
ele lia o mesmo livro que encantara
sua infância e que o pai, falecido,
lhe deixara. E ficava horas olhando
os desenhos que mostravam os homenzinhos verdes com as curiosas
antenas na cabeça.
Recentemente ele leu no jornal a
notícia de que duas grandes empresas, a Boeing e a Space Adventures,
estão planejando entrar no ramo do
turismo espacial. E isso lhe deu uma
ideia, emocionante ideia: por que
não fazer a mesma coisa no Brasil?
Poderia, com o dinheiro e a experiência administrativa longamente
acumulada, criar sua própria empresa de viagens espaciais. Mais
que isso, poderia ser se não o piloto
da nave, pelo menos o copiloto. E viver, finalmente, a aventura com a
qual sempre sonhara.
Mas não vai fazer isso. Por causa
de um temor que tem. O temor de
que um dos passageiros, no meio do
voo, livre-se do capote em que está
embuçado e se revele um homenzinho verde com curiosas antenas na
cabeça. Em seguida, sacando sua
pistola espacial anunciará:
- Isto é um sequestro. Esta nave
espacial vai para Marte. E de lá nunca mais retornará.
MOACYR SCLIAR escreve nesta coluna, às segundas-feiras, um texto de ficção baseado em notícias
publicadas no jornal.
moacyr.scliar@uol.com.br
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