São Paulo, sábado, 04 de novembro de 2006

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WALTER CENEVIVA

Limites na trilha de Lula

Considerando que há 4 anos pela frente, é preciso chamar a atenção para o que Lula pode e o que não pode fazer

VITORIOSO POR placar expressivo, Luiz Inácio Lula da Silva falou em reforma política, em seu primeiro discurso. Embora política, a modificação projetada envolve questões jurídicas. Se as reformas desejadas se estenderem por outros campos, muitos temas constitucionais também serão envolvidos. Considerando que temos quatro anos pela frente é razoável chamar a atenção do leitor para o que Lula pode e o que não pode fazer, embora se saiba que a maioria do Legislativo logo se comporá com o Executivo, para satisfazer, no regime de trocas, os pedidos da presidência da República, ressalvadas as exceções de hábito.
A Constituição limita a iniciativa de certas leis ao Executivo e ao Judiciário. Iniciativa restrita significa a existência de leis que só podem ser submetidas ao Congresso se a correspondente proposta for feita pelo Executivo ou pelo Judiciário, nas respectivas áreas de competência. Por esse motivo está, no artigo 61 da Carta, ser privativa do presidente da República a iniciativa para as leis que menciona (fixar o efetivo das Forças Armadas no inciso I e dispor sobre assuntos indicados em seis letras do inciso II, como, por exemplo, criar cargos, funções ou empregos públicos na administração ou aumentar vencimentos).
A emenda constitucional não sofre a mesma limitação. O presidente da República é um dos credenciados para propor qualquer emenda que lhe pareça oportuna ou necessária, apenas com a normal dificuldade do quórum privilegiado de sua votação. Mantida desde 1988, é da competência exclusiva do presidente editar medidas provisórias, cujo campo de aplicação, contudo, foi limitado por várias emendas constitucionais. O poder presidencial continua amplo, porque o Judiciário sempre hesitou em apreciar o requisito do relevo e da premência, embora exigidos pelo artigo 62 da Constituição. Por outro lado, o presidente tem competência privativa para exercer a direção suprema da administração federal (artigo 85), com poder decisório sobre questões fundamentais.
As anotações precedentes têm estrito caráter formal. Nós sabemos que, na prática, há muitas diferenças. Vamos admitir, por hipótese, que Luiz Inácio Lula da Silva queira extrair, da grande votação recebida, autoridade para alterações radicais na escala do Poder. Ou até com o propósito de enfrentar a resistência fundada na Constituição, para alterar o que os juristas chamam de cláusulas pétreas (parágrafo 4º do artigo 60), que não permitem deliberação a respeito de emenda tendente a abolir a forma federativa do Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico, a separação dos poderes e os direitos e garantias individuais.
O leitor acompanhará a conduta do presidente, contraposta à ação do Judiciário e do Legislativo em face das novas medidas que ele adote. Lembre-se que a magistratura é órgão da administração pública, tendente a favorecer a ação dos dois outros poderes, pois os três são independentes uns dos outros. Sem a participação cada vez maior, de cada eleitor-leitor, sobre as ações da administração pública, cobrando eficiência e licitude, estaremos sempre a reboque de decisões menos voltadas para o verdadeiro interesse coletivo do bem estar de toda a sociedade. Atenção, portanto.


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