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Drogado aos 11 / ex-traficante aos 35
De família de classe média de SP, Jaques Chulam foi preso por tráfico em Lisboa em 2004 e aos 35 lança livro sobre sua história
Divulgação
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Jaques Chulam, 35, autor do livro "Surfista, ex-drogado, ex-traficante", no qual conta como foi seu caminho nas drogas e na prisão
ALEXANDRE NOBESCHI
DA REDAÇÃO
Precoce, aos seis anos, ele começou a surfar. Aos 11, além de
pegar onda, usava lança-perfume e maconha. Depois, passou
para LSD, cocaína, ecstasy e,
por fim, crack. Aos 30, foi preso
em Lisboa por tráfico internacional de drogas.
Filho de classe média de São
Paulo, surfista e ex-estudante
de engenharia, Jaques Chulam,
35, foi preso em 2004 ao aterrissar no aeroporto da Portela
de Sacavém com um paraglider
"turbinado" com cocaína.
Passou quase dois anos e
meio preso -lá a pena por tráfico é de quatro a 12 anos. Obteve
a liberdade condicional por
bom comportamento e, sendo
brasileiro, foi extraditado.
Após abandonar as drogas e o
tráfico, escreveu um livro para
contar a história de um jovem
que tinha tudo para ser promissor e foi derrubado pelo vício.
"Surfista, ex-drogado, ex-traficante" (ed. Francisco Alves) foi
lançado no último dia 20.
Leia abaixo trechos da entrevista concedida por e-mail, enquanto Chulam estava na China para visitar uma feira de
produtos esportivos.
FOLHA - No livro, você conta que
começou a usar drogas ainda garoto. Qual foi o seu caminho por elas?
JAQUES CHULAM - Encontrei nas
drogas uma fórmula mágica.
Era algo que me dava uma falsa
impressão de bem-estar, mas
que me prejudicou muito. Comecei com cola, lança-perfume, cerveja e maconha quando
tinha apenas 11 anos. Depois
veio LSD, cocaína, ecstasy e finalmente crack.
FOLHA - Sendo de uma família de
classe média, como fazia para sustentar o vício?
CHULAM - No começo, usava dinheiro da mesada e também ganhava muita droga da galera
mais velha. Depois de alguns
anos, comecei a traficar para
sustentar meu próprio vício e
financiar minhas loucuras.
FOLHA - Quando seus pais descobriram que você usava drogas? Como eles trataram do tema em casa?
CHULAM - Quando eu tinha 16
anos, meu pai me perguntou no
café da manhã se eu usava drogas. Falei a verdade. Disse que
fumava maconha desde os 11
anos e que todos os meus amigos fumavam. Meus pais ficaram em estado de choque, perdi a viagem para Bali [Indonésia] que meu pai ia me dar.
Depois desse dia não parei de
usar drogas, mas passei a usar
muito colírio, e a mentira passou a fazer parte do meu relacionamento com meus pais. Os
familiares, infelizmente, sofrem juntos. E, quase sempre,
sofrem muito mais, porque os
filhos viciados estão anestesiados pelo uso de drogas.
FOLHA - Qual foi a reação deles?
CHULAM - Tentaram me ajudar,
mas, se o usuário não quiser
ajuda, dificilmente isso irá funcionar. Meus pais não tiveram a
mínima culpa. Sempre me deram de tudo do bom em termos
de educação, carinho e diálogo.
FOLHA - Recentemente, um jovem
da classe média do Rio matou a namorada quando estava no pico do
crack. Você era agressivo quando estava drogado?
CHULAM - Nunca fui agressivo,
mas sob efeito de drogas tudo é
possível. Principalmente com o
crack, cujo efeito cria uma
compulsão sem limites.
FOLHA - O que leva um jovem de
classe média a entrar para o tráfico?
CHULAM - O jovem de classe
média não precisa trabalhar,
ganha mesada, fala inglês, tem
passaporte, é de boa aparência
e acaba cercado por jovens nas
mesmas condições.
Por esses motivos, acaba entrando em uma grande enrascada, vira noites em boates, vira
dias em festas raves e tem um
certo senso de que em tudo se
pode dar um jeito. Acaba conhecendo as drogas, pessoas
que as usam, pessoas que as
vendem e acredita que aí está
uma oportunidade de ganhar
dinheiro, status e fama.
FOLHA - Como foi a história de
plantar maconha no Havaí?
CHULAM - No Havaí, um grama
de pakalolo [em polinésio paka=mato e lolo=louco] custa
US$ 25, e lá ia eu com um amigo
havaiano veterano da Guerra
do Vietnã plantar para fumar,
fazer um dinheirinho e surfar.
FOLHA - Você acredita que os jovens de classe média não enxergam
o perigo de traficar ou não acreditam que possam ser presos por repassar drogas a colegas?
CHULAM - Primeiramente, é lógico que eles não enxergam, estão todos entorpecidos, dominados pelo vício, e o ego está superinflado. Em segundo lugar,
temos a cultura no Brasil de
que para tudo se dá um "jeitinho", mas com drogas é diferente. A polícia está fazendo o
seu trabalho, tanto que o número de jovens de classe média
presos na Fundação Casa (antiga Febem) já subiu 30%.
FOLHA - Você conta no livro que foi
preso em Lisboa em 2004 ao levar
cocaína em um paraglider. Você
nessa época integrava alguma rede
de tráfico internacional ou fazia isso
de forma independente?
CHULAM - Fiz essa insanidade
sozinho. Queria lucrar sozinho.
FOLHA - Qual foi a sua reação ao
ser preso? O que pensou na hora?
CHULAM - Minha alma doía. A
visão daquela que seria minha
casa pelos próximos anos me
embrulhou o estômago, só não
vomitei porque não tinha nada
para vomitar. Senti muito medo. Nos três primeiros dias dormi direto, na esperança de
acordar de novo no avião.
FOLHA - Na sua opinião, o jovem
de classe média que consome drogas tem consciência de que colabora
com a violência urbana?
CHULAM - Não tenho dúvidas
disso, todos sabem que o dinheiro sujo das drogas financia
o crime organizado.
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