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ONU critica nova lei antidrogas brasileira
Segundo documento, lei brasileira "pode até prejudicar a investigação e o julgamento das atividades ilícitas relacionadas a drogas"
Estrutura da rede pública é deficiente para atender usuário, afirma relatório; para governo, rede de ONGs dará suporte à demanda
ANDRÉA MICHAEL
FELIPE SELIGMAN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Relatório de um órgão da
ONU (Organização das Nações
Unidas) divulgado ontem diz
que o Brasil terá dificuldades
para aplicar a nova legislação
antidrogas -que trata o usuário como doente-, por falta de
estrutura da rede pública.
A lei, de 2006, "pode até prejudicar a investigação e o julgamento das atividades ilícitas relacionadas a drogas, e pode dar
a entender à opinião pública
que o governo está tratando o
narcotráfico com mais indulgência", diz o documento.
A legislação anterior dava o
mesmo tratamento a usuários e
traficantes.
Apresentado em Brasília, o
relatório é da Jife (Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes), braço jurídico do
UNODC, escritório da ONU
contra drogas e crime. Contém
dados de todos os continentes.
O secretário nacional Antidrogas, Paulo Uchôa, refutou as
críticas. Disse que a rede pública está em preparação e que, ao
mesmo tempo, disporá de uma
estrutura de ONGs que poderá
dar suporte à demanda e atender usuários de drogas, que, por
determinação judicial, devam
ser tratados como doentes.
A falta de estrutura, porém, é
reconhecida por quem atua na
área. "A lei é boa. O quadro de
desassistência é escandalosamente dramático não só no
Distrito Federal como no Brasil. A rede pública precisará se
equipar", diz o promotor Jairo
Bisol, que atua em Brasília.
Pedro Gabriel, coordenador
da área técnica de saúde mental, álcool e drogas do Ministério da Saúde, admite que existe
"uma lacuna entre a demanda
de tratamento e a oferta de serviços", mas afirma que "o Brasil
vive uma tendência de ampliação da rede de atendimento ao
usuário e, talvez, devesse ter sido registrado esse processo".
Quanto à "condescendência"
que a Jife vê na lei, o representante regional do UNODC para
o Brasil e Cone Sul, Giovanni
Quaglia, citou experiências de
outros países que combinam o
tratamento médico do usuário
na mesma medida em que ele
colabore com a Justiça para
ajudar no combate ao crime.
Consumo de drogas
Outro dado da Jife é que, ao
contrário da América do Sul,
onda a droga mais consumida
pelos estudantes é a maconha,
a preferência no Brasil seria
por substâncias inaláveis (basicamente cola de sapateiro).
A questão é polêmica, pois a
Senad (Secretaria Nacional Antidrogas) alega que, pela legislação, a cola não é uma substância ilícita -portanto, os critérios do relatório divergem dos
usados para classificar o que é
legal ou ilegal no Brasil.
Para a Senad, a maconha
continua a ser a droga mais
consumida entre os jovens -a
pasta se baseia em levantamento domiciliar sobre o uso de
drogas psicotrópicas, de 2005.
"O relatório é uma publicação legítima, mas precisamos
de um olhar um pouco crítico,
porque muitos países não possuem sistema de coleta de dados ou, quando possuem, não
são confiáveis", disse Uchôa.
A Jife leva em conta, porém,
um estudo do UNODC e da Comissão Interamericana de
Controle e Abuso de Drogas
que mostra o Brasil como o primeiro colocado no uso de inalantes entre os alunos do ensino médio da América do Sul.
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