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SAÚDE
Grupo criado para definir política para o setor deixa para o presidente Lula decisões como restrição à propaganda e sobretaxa
Governo não conclui projeto sobre álcool
FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL
Foram nove meses de trabalho,
mas o grupo interministerial criado para debater uma política pública contra o álcool para o país
não chegou a lugar nenhum nos
pontos cruciais do assunto: restrição de propaganda, aumento do
preço do produto, limitações à
venda, todas questões que ultrapassam os limites da Saúde, que
encabeça a discussão no governo.
A proposta que segue para o ministro da Saúde, Humberto Costa,
nos próximos dias, deixou as
questões em aberto. Como não
houve acordo nem entre os ministérios envolvidos -também
participaram das discussões a indústria e representantes de entidades científicas- a idéia, diz Pedro Gabriel Delgado, coordenador de Saúde Mental do ministério e do grupo interministerial, é
deixar as questões polêmicas a
cargo do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva (PT), que levará o
projeto ao Congresso. Costa é favorável às propostas de restrição e
ao aumento de preço.
"O pedido do grupo é ir com o
ministro ao presidente, justamente para dar a importância devida a
um problema complexo, que só
pode ser um problema de governo", disse Delgado. "Você só pode
afirmar que um governo tem uma
política quando ele desenvolve
ações em várias áreas."
O que é atribuição só da Saúde,
diz Delgado, já começou a andar.
Como uma proposta de sistema
de atenção para pessoas que têm
problemas com o álcool. Nele, os
postos de saúde trabalharão articulados com os Caps (Centros de
Atenção Psicossocial) de álcool e
de outras drogas.
Propaganda
O resumo dos debates realizados até janeiro chegará a Lula bastante atrasado. A idéia era fechá-lo em setembro de 2003. Em outubro, já encaminhado o pedido de
adiamento ao presidente, a pasta
admitia recuar na idéia de proibir
toda a propaganda de bebida alcoólica das 6h às 22h no rádio e na
TV e propunha que produtores
de cerveja e vinho pudessem fazer
"chamadas de patrocínio".
Hoje no país a propaganda de
cerveja é liberada em qualquer
horário. Somente bebidas de alto
teor alcoólico, como a cachaça,
têm a propaganda proibida em
rádio e televisão das 6h às 21h.
A restrição total de anúncios de
álcool das 6h às 22h era a proposta
original do grupo, iniciado em
maio de 2003. Foi estabelecido depois que o governo, pressionado
pelas cervejarias, decidiu retirar
de votação na Câmara uma
emenda que estendia à cerveja a
restrição de propaganda.
O álcool é o primeiro fator de
risco à saúde no país para adoecimento e mortes evitáveis, na frente de males como o cigarro, o sexo
inseguro e a falta de saneamento.
"O assunto carece não só de
uma definição da política como
da aplicação da lei existente", opina o psiquiatra Flávio Pechansky,
um dos especialistas que debateram consenso sobre a política pública a ser publicado na Revista
Brasileira de Psiquiatria. O texto
defende as restrições e a taxação.
Segundo o Ministério de Saúde,
70% a 80% da população faz uso
da bebida na vida, 30% tem problemas com o álcool e 10%, graves
problemas, como dependência.
Brasil e EUA
O relatório sobre uso de drogas
e neurociência, divulgado pela
Organização Mundial da Saúde
em Brasília em março, mostrou
que, apesar de o consumo por
adulto/ano de álcool puro ser menor no Brasil que nos EUA (8,6 litros contra 9,7 litros dos americanos), aqui o padrão é abusivo.
Para medir isso, explica Delgado, a OMS cruzou dados sobre
dependência de álcool, acidentes
de trânsito, violência doméstica,
consumo excessivo nos finais de
semana. Chegou a um tipo de indicador que vai de um (consumo
menos danoso) a quatro. Acima
de três o consumo é considerado
muito nocivo. O Brasil ficou com
índice 3,1, enquanto os EUA, dois.
O Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas,
referência em estudos sobre o assunto, tem um texto clássico, de
15 anos atrás, que mostra que a
maior parte dos cadáveres do IML
(Instituto Médico Legal) de São
Paulo tinha álcool no sangue.
Um trabalho publicado em 2002
pelo centro mostrou que 90% das
726.429 internações pelo uso de
psicotrópicos entre 1988 e 1999 foram em razão do álcool. Não há
dados sobre o custo social do álcool. A Saúde trabalha na conta
para tentar convencer o governo.
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