São Paulo, domingo, 05 de maio de 2002

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DANUZA LEÃO

Você está viva?

Quando uma mulher e um homem se vêem pela primeira vez, no mesmo instante se acende uma faísca; é a pulsão da vida.
la surge de uma imediata e inconsciente avaliação de parte a parte, que acontece o tempo todo; pode ser com o cunhado, o feirante, o padre, o marido da maior amiga, e independe de beleza, charme ou classe social.
Essa coisa não vai necessariamente se desenvolver em alguma outra coisa, mas quanto mais intimidade você tiver com você mesma -e com seus pensamentos- mais rapidamente vai perceber o que está acontecendo. Mas é raro: a maioria das pessoas não identifica o que sente, sobretudo porque essa avaliação passa por uma fina peneira de censuras mentais morais e sociais.
Ninguém está livre disso, desde que o outro seja do outro sexo -ou do sexo que lhe interessa. É difícil botar em palavras sensações, mas tudo parte de uma faísca que é positiva ou negativa; se é negativa, não se fala mais nisso. Se é positiva e você está só - portanto com tempo e coragem para brincar-, a fantasia pode ir longe. Se estiver tomando uma bebida, aí então ela é ilimitada.
Você já largou seu freio de mão mental e deixou sua imaginação correr frouxa? Vamos admitir: é difícil. E as convenções sociais, e os preconceitos, e o medo? Aprendemos que se peca até em pensamentos; com isso brecamos a maioria deles e depois não sabemos por que nossa cabeça é um nó. Mas se deixarmos eles correrem soltos será que as coisas ficam mais fáceis? Parece que sim.
No primeiro olhar se define se o outro é ou não possível -se dá pé ou não. A sensação não precisa ser recíproca, mas, quando isso acontece, é imediatamente percebida pelos dois. Estabelece-se então uma energia que faz com que esse momento seja diferente de todos os outros. O olho brilha, o corpo fica tenso e você sente o prazer supremo, que é o de se saber viva.
Para uns isso nunca acontece, e não é uma questão de idade: existem jovens que não sabem nem nunca vão saber do que se trata, e por esses jamais alguém vai se interessar. Já outros na quinta idade, em seu leito de morte, se entrar uma enfermeira gostosa, imediatamente a corrente se estabelece. Atenção: essa eletricidade contagia, por isso tantos estão sempre cercados enquanto outros sofrem de um incurável desinteresse do sexo oposto. Pois é.
Alguns, mais corajosos, não só têm consciência a cada vez que isso acontece como se deixam levar; aí, correm o risco, que para a mulher é sempre maior. Um homem que segue seu impulso e arrasta com ele alguém de classe muito inferior é sempre perdoado -até porque eles sabem até onde devem ir e voltam logo para seu lugar de origem. Já mulher não pode; não dá para a madame ter um caso com o motorista de caminhão porque ninguém vai aceitar. Fora que elas têm a mania de se apaixonar, o que faz toda a diferença. Aliás, devem acontecer muito mais coisas na vida de nossos amigos mais íntimos do que podemos imaginar.
O tema é interessante; aliás, interessantíssimo. Fique atenta: já percebeu que vai sempre à mesma loja para ser atendida pelo mesmo vendedor e sempre ao mesmo restaurante para ser servida pelo mesmo garçom? Já pensou nisso?
Vale sempre a pena saber a quantas a gente anda; se ainda está viva ou se respira ligada nos aparelhos, que são a educação, a moral, a religião e os bons costumes. Sendo assim, por mais que sua mulher seja um poço de virtudes e apaixonada por você, nunca a deixe só com um homem, nem mesmo com o dentista.
Homem e mulher, quando se juntam, ninguém sabe o que pode acontecer.
Esse é o perigo -e a graça- da vida.

E-mail - danuza.leao@uol.com.br



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