São Paulo, domingo, 05 de maio de 2002

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SAÚDE

Cirurgia para miopia "falseia" pressão ocular

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

As cirurgias refrativas para corrigir a miopia podem falsear a pressão intra-ocular e dificultar o diagnóstico precoce do glaucoma, doença causada pelo aumento da pressão no globo ocular, que prejudica o nervo ótico e causa perda da visão. Só no ano passado foram feitas 300 mil cirurgias refrativas no país.
Segundo oftalmologistas, a pressão ocular elevada é o principal fator de risco para o glaucoma, doença que atinge 900 mil brasileiros e é a segunda maior causa de cegueira, conforme o Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Com a cirurgia, a pressão pode parecer menor do que realmente é.
Por exemplo: com a cirurgia, um exame pode mostrar uma pressão de 14 mmHg (milímetros de mercúrio), apesar de ela ser de 22 mmHg -nível que pode ser indicativo de glaucoma.
Isso acontece porque a córnea, depois da cirurgia refrativa, fica mais fina, e o tonômetro (aparelho que mede a pressão intra-ocular) é calibrado para uma espessura de córnea normal, induzindo, assim, a um erro de medida.
Segundo os oftalmologistas, para cada 50 micra (medida equivalente a um milésimo de milímetro) retiradas da espessura da córnea, reduz-se cerca de 2,5 mm na mensuração da pressão intra-ocular.
Além da medida da pressão ocular, os oftalmologistas utilizam para o diagnóstico da doença o exame do campo visual e do nervo ótico.
Segundo Ricardo Uras, 58, professor da disciplina de oftalmologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), o ideal é que o médico seja sempre informado de que o paciente realizou uma cirurgia refrativa.
Geralmente, as cirurgias a laser não deixam cicatriz no interior do olho e, se não for avisado sobre o procedimento, o profissional pode ignorar o fato de estar diante de uma pressão ocular "falseada".
"Muita gente fica tão aliviada de não precisar mais usar óculos que esquece da cirurgia e nem se lembra de relatá-la ao médico", afirma Uras.
Segundo o oftalmologista Augusto Paranhos, 32, chefe do setor de glaucoma da Unifesp, sabendo que o paciente operado geralmente tem uma medida de pressão intra-ocular hipoestimada, ou seja, menor do que na verdade é, o médico deve ficar mais atento aos outros exames que podem caracterizar o dano do glaucoma. "Esses exames são, inclusive, mais importantes que a medida da pressão em si", afirma.
Paranhos afirma ainda que, embora a pressão não seja o único fator de risco para o glaucoma, diminuí-la, seja por meio de medicamento, laser ou cirurgia, ainda é a única forma efetiva de controlá-la, mesmo nos pacientes com glaucoma em que os níveis de pressão não estejam elevados.
Para o oftalmologista Rubens Belfort, 55, só uma pressão ocular elevada não indica o glaucoma. "Uma pessoa pode ter pressão considerada alta e não apresentar, enquanto outra, com pressão normal, pode ter a doença."
Por isso prevenir ainda é o melhor remédio. Segundo o oftalmologista Newton Cara José, professor titular da Faculdade de Medicina da USP-SP, todas as pessoas acima de 40 anos deveriam consultar anualmente um oftalmologista para avaliar a pressão intra-ocular e as condições da retina.

Catarata
Rubens Belfort afirma que a cirurgia refrativa também altera a medida da córnea. Por isso, antes da operação, o médico deve registrar a medida ocular e informá-la ao paciente.
Em uma futura cirurgia de catarata, por exemplo, parte do cálculo da lente intra-ocular que será colocada no paciente deriva de medidas corneanas que ficaram alteradas após a cirurgia refrativa.
"Sem saber quanto era essa medida anterior à cirurgia de miopia, pode acontecer de o paciente operar-se da catarata e ter de usar óculos de grau forte depois", afirma Belfort.


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