São Paulo, sábado, 05 de maio de 2007

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WALTER CENEVIVA

Danos da imagem descuidada

O conflito entre motoqueiros e motoristas tenderá a terminar ou diminuir se as motos tiverem faixa determinada

SE VOCÊ NÃO é de São Paulo, talvez ignore que o paulistano e os motoqueiros vivem em uma espécie de conflito com o trânsito da cidade, cuja frota registrada anda pela casa de 5,8 milhões de veículos. Considerando que há muito mais paulistanos que motoqueiros, estes prejudicam sua imagem avançando entre carros, em curvas ousadas e acionando insistentemente o bi-bi-bi de sua buzina repetitiva, como se fossem pernilongos zumbindo numa noite de verão.
Salto da figura dos "motoqueiros" para a dos membros do Poder Legislativo, em todos os níveis de governo. Com freqüência mostram mais interesse em melhorar suas condições de vida (mais salários, mais benefícios adicionais, mais aposentadoria) do que servir ao povo. No nível federal, sua imagem é prejudicada pelos que ganham nas loterias dezenas de vezes e pelos que fazem campanhas eleitorais na oposição, logo se acertando com o chefe do Executivo (ou até antes, de olho nas pesquisas). Transformam o Poder Legislativo em centro de acertos de duvidosa moralidade política, tais as concessões em troca de cargos.
Dando harmonia aos parágrafos anteriores, cabe dizer que motoqueiros e parlamentares descuidam de sua imagem. Aqueles com uma desvantagem: na selva das ruas paulistanas, muitos deles morrem nos abusos entre automóveis e caminhões. Na rua da Consolação, uma das artérias paulistanas mais movimentadas, com oito faixas de rolamento, já contei 25 motocicletas aproveitando a luz vermelha para se concentrar sobre a faixa de um cruzamento e avançar no sinal verde, atrapalhando o trânsito. Com ou sem razão, pois têm trabalho muito sacrificado, os motoqueiros são malvistos em São Paulo, o que parece não os incomodar.
É freqüente ver políticos candidatarem-se anunciando objetivos que esquecem logo depois da posse. Protegem-se mutuamente. Levam a necessária imunidade constitucional a exageros que a tornam imoral. São malvistos por isso, o que também parece não os incomodar, porque a cada legislatura repetem os mesmos comportamentos. A Constituição diz que os deputados são os representantes do povo, conforme se lê do artigo 45. Todavia, só uns 10% do todo são diretamente eleitos. Os outros 90% são eleitos pela redistribuição dos sufrágios das legendas. Essa é a razão pela qual muitas vezes um partido de menor expressão, com candidato provido de forte apelo popular, cria uma bancada na qual só ele foi eleito individualmente.
E daí? O conflito entre motoqueiros, motoristas e pedestres tenderá a terminar, ou diminuir, se as motos tiverem uma faixa determinada da qual não possam sair, ou, pelo menos, proibidas de trançar no meio dos veículos. A descrença dos eleitores em seus legisladores tenderá a terminar com imposição da fidelidade partidária (radical ou progressiva), com restrições à mudança de partidos, com o cumprimento dos deveres de comparecimento e participação nos trabalhos.
Que não haja, porém, ilusão. Os legisladores são os de sempre, alguns sempre reeleitos. Os motoqueiros, em maioria, não sabem nem querem saber do disciplinamento de sua conduta. Vivem segundo a segundo e cada segunda é um milagre que não se repete. Aqueles e estes descuidados de sua imagem.


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