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WALTER CENEVIVA
Danos da imagem descuidada
O conflito entre motoqueiros e motoristas tenderá a terminar ou diminuir se as motos tiverem faixa determinada
SE VOCÊ NÃO é de São Paulo, talvez ignore que o paulistano e
os motoqueiros vivem em uma
espécie de conflito com o trânsito da
cidade, cuja frota registrada anda
pela casa de 5,8 milhões de veículos.
Considerando que há muito mais
paulistanos que motoqueiros, estes
prejudicam sua imagem avançando
entre carros, em curvas ousadas e
acionando insistentemente o bi-bi-bi de sua buzina repetitiva, como se
fossem pernilongos zumbindo numa noite de verão.
Salto da figura dos "motoqueiros"
para a dos membros do Poder Legislativo, em todos os níveis de governo. Com freqüência mostram mais
interesse em melhorar suas condições de vida (mais salários, mais benefícios adicionais, mais aposentadoria) do que servir ao povo. No nível federal, sua imagem é prejudicada pelos que ganham nas loterias dezenas de vezes e pelos que fazem
campanhas eleitorais na oposição,
logo se acertando com o chefe do
Executivo (ou até antes, de olho nas
pesquisas). Transformam o Poder
Legislativo em centro de acertos de
duvidosa moralidade política, tais as
concessões em troca de cargos.
Dando harmonia aos parágrafos
anteriores, cabe dizer que motoqueiros e parlamentares descuidam
de sua imagem. Aqueles com uma
desvantagem: na selva das ruas paulistanas, muitos deles morrem nos
abusos entre automóveis e caminhões. Na rua da Consolação, uma
das artérias paulistanas mais movimentadas, com oito faixas de rolamento, já contei 25 motocicletas
aproveitando a luz vermelha para se
concentrar sobre a faixa de um cruzamento e avançar no sinal verde,
atrapalhando o trânsito. Com ou
sem razão, pois têm trabalho muito
sacrificado, os motoqueiros são malvistos em São Paulo, o que parece
não os incomodar.
É freqüente ver políticos candidatarem-se anunciando objetivos que
esquecem logo depois da posse. Protegem-se mutuamente. Levam a necessária imunidade constitucional a
exageros que a tornam imoral. São
malvistos por isso, o que também
parece não os incomodar, porque a
cada legislatura repetem os mesmos
comportamentos. A Constituição
diz que os deputados são os representantes do povo, conforme se lê do
artigo 45. Todavia, só uns 10% do todo são diretamente eleitos. Os outros 90% são eleitos pela redistribuição dos sufrágios das legendas. Essa
é a razão pela qual muitas vezes um
partido de menor expressão, com
candidato provido de forte apelo popular, cria uma bancada na qual só
ele foi eleito individualmente.
E daí? O conflito entre motoqueiros, motoristas e pedestres tenderá
a terminar, ou diminuir, se as motos
tiverem uma faixa determinada da
qual não possam sair, ou, pelo menos, proibidas de trançar no meio
dos veículos. A descrença dos eleitores em seus legisladores tenderá a
terminar com imposição da fidelidade partidária (radical ou progressiva), com restrições à mudança de
partidos, com o cumprimento dos
deveres de comparecimento e participação nos trabalhos.
Que não haja, porém, ilusão. Os legisladores são os de sempre, alguns
sempre reeleitos. Os motoqueiros,
em maioria, não sabem nem querem
saber do disciplinamento de sua
conduta. Vivem segundo a segundo
e cada segunda é um milagre que
não se repete. Aqueles e estes descuidados de sua imagem.
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