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VIOLÊNCIA
Entre 1999 e 2001, número de queixas subiu 43,7% no Estado de São Paulo; ocorrências chegam a 30 mil por mês
Cresce denúncia de crimes contra a mulher
GABRIELA ATHIAS
DA REPORTAGEM LOCAL
A dona-de-casa Suely, 39, cansou de apanhar calada. Na quinta-feira passada, nervosa e chorando, ela procurou a Associação de
Mulheres da Zona Leste para denunciar 25 anos de pancadaria e
humilhação. "Se eu não tomar
uma atitude, meu marido vai me
matar", disse ela ao pedir sigilo
sobre seu nome verdadeiro.
A média mensal dos registros
policiais de violência contra a mulher aumentou cerca de 43,7% entre 1999 e 2001 no Estado de São
Paulo. Pelos boletins de ocorrência registrados nas 125 Delegacias
de Defesa da Mulher, neste ano
foram aproximadamente 30 mil
queixas por mês, sendo 10.016 referentes a agressões.
Os números da Secretaria da Segurança Pública de São Paulo indicam, em uma primeira leitura, o
aumento dos casos de violência
-como agressões físicas, crimes
sexuais e maus-tratos. Mas podem traduzir apenas o aumento
das denúncias e, consequentemente, de uma mudança de comportamento das mulheres.
"O que mais aumentou foi a coragem das mulheres de reagir",
diz Cláudia Maria Nogueira Santos, 33, uma das cinco advogadas
da associação da zona leste, entidade que presta assistência jurídica gratuita a 150 novas vítimas por
mês e acompanha centenas de
processos civis e criminais movidos por mulheres para quem casamento é sinônimo de pancada.
A maioria das médicas, advogadas, delegadas e ativistas do movimento feminista ouvidas pela Folha diz que a violência contra a
mulher -cometida pelo companheiro no âmbito familiar- é
muito frequente.
Os números da secretaria confirmam dados preliminares de
uma pesquisa ainda inédita patrocinada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) em sete
países, entre os quais o Brasil,
mostrando que uma em cada três
moradoras da cidade de São Paulo é vítima de violência.
A coordenadora da pesquisa,
Lilia Blima Schraiber, explica que
esse percentual é compatível com
as estatísticas internacionais das
grandes metrópoles. A equipe visitou, em 2000, 2.160 domicílios,
escolhidos de acordo com critérios censitários, para entrevistar
mulheres entre 15 e 49 anos.
Como esse é um crime que
ocorre na maioria das vezes dentro de casa, só vira estatística
quando a mulher decide denunciar. Por isso, a tendência de
quem atua na área é acreditar que
boa parte da explosão dos boletins de ocorrência se deve principalmente a essa nova postura.
Além de terem perdido o medo
de denunciar, há outros fatores
que devem ser levados em conta
para entender o problema. "A crise econômica está contribuindo
para a deterioração das relações
familiares", diz a delegada Jeanette Sanjar, que trabalha há sete
anos em delegacias de defesa da
mulher. "E isso agrava a violência
contra a mulher", completa.
"Eu sou cobrador de ônibus. A
senhora sabe quanta raiva eu passo na rua"?, perguntou a Cláudia
(advogada da associação de mulheres) um homem acusado de
bater na mulher.
Para Lilia, embora crimes cometidos no âmbito doméstico tenham características próprias,
eles estão relacionados à escalada
da violência urbana. No entanto,
diz, é impossível quantificar a influência da crise econômica sobre
o aumento das denúncias.
Já há pesquisas que dão algumas pistas sobre uma eventual relação entre a violência contra a
mulher e a pobreza. As ativistas
de movimentos feministas dizem
que, embora esse tipo de agressão
esteja presente em todas as camadas sociais, a violência pesa mais
no dia-a-dia das mais carentes.
Na seara dos gastos públicos, a
pressão maior seria sobre a saúde,
já que essas mulheres procuram
com muita frequência os postos
para tratar dos "efeitos colaterais"
da violência: dor de estômago, insônia e mal-estar.
"Elas somatizam as agressões",
diz Letíssia Massula, do comitê latino-americano da mulher. No
jargão dos profissionais da área,
elas são "poliqueixosas".
Segundo a OMS -para quem
violência doméstica é um problema de saúde pública-, mulheres
agredidas constantemente perdem um ano de vida saudável a
cada cinco anos.
Suely -a dona-de-casa que resolveu denunciar o marido- tem
39 anos, mas aparenta ter pelo
menos 50. Ela se queixa de dores
na coluna, insônia e de ficar com o
"corpo gelado" de vez em quando. "Deve ser por causa do medo e
do nervoso", arrisca.
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