São Paulo, quinta-feira, 05 de julho de 2007

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Fapesp decide autorizar pesquisa sobre ecstasy

Presidente da fundação chegou a cancelar o projeto em junho após veiculação na mídia

Segundo as pesquisadoras, uma das idéias era avaliar "o impacto dessas informações no comportamento dos usuários da droga"

LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

A Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de são Paulo) decidiu ontem autorizar a continuidade do projeto de pesquisa "Implantação e Avaliação de Programa de Redução de Danos para o Uso de Ecstasy na Cidade de São Paulo", coordenado pela pós-doutoranda em psicologia Stella Pereira de Almeida, 43, e pela professora titular do Instituto de Psicologia da USP, Maria Teresa Araujo Silva, 67.
O projeto havia sido suspenso por decisão de Carlos Vogt, presidente da Fapesp, no dia 18 de junho, sob alegação de graves "denúncias veiculadas pela imprensa", envolvendo a execução da pesquisa.
As "denúncias" consistiram de noticiário sobre a distribuição (em festas e baladas onde é notório o consumo de ecstasy) de folhetos com informações sobre como consumir a droga com menos riscos à saúde.
Um dos folhetos distribuídos, por exemplo, dizia: "Efeitos fisiológicos do ecstasy: aumento da temperatura corporal (atingindo altos graus, há risco de coma ou morte)". Seguiam informações sobre os sintomas de intoxicação aguda pela droga: "febre acima de 38ºC, tontura, náusea, confusão mental, diminuição dos reflexos, dor de cabeça, taquicardia, palpitação".
Para diminuir os riscos, o folheto propunha: "Se você pretende consumir ecstasy, evite fazê-lo sozinho, tome líquidos não-alcoólicos sem exagero, vista roupas leves, descanse a cada meia hora, quando dança. Caso tenha sintomas de intoxicação, procure rapidamente auxílio médico e relate o que consumiu. Observe que portar drogas ilegais é crime, mas relatar que as consumiu não é".
A estratégia de redução de danos é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde e aplicada em países como Holanda e Grã-Bretanha, além do Brasil. Adversários, entretanto, acreditam que algumas abordagens feitas em nome da redução de danos constituem, na verdade, em incitamento ao consumo de drogas.
"A idéia do projeto era exatamente avaliar o impacto dessas informações no comportamento dos usuários da droga", diz a professora Maria Teresa. Foi nessa etapa que a medida suspensiva atingiu o trabalho.
Médicos, psicólogos, farmacologistas, psiquiatras -intelectuais, docentes e cientistas com especialização em prestigiosas instituições dos EUA e Europa- protestaram contra a suspensão da pesquisa. Foi organizado um manifesto com centenas de assinaturas em apoio às pesquisadoras.
Segundo o assessor de comunicação da Fapesp, Fernando Cunha, suspensões de financiamento "são comuns" em casos de atrasos na entrega de relatórios científicos. Ele diz, entretanto, que "nunca viu" essa providência ser adotada "a partir de noticiário da imprensa" -como aconteceu no caso da pesquisa sobre ecstasy.
O professor Roberto DeLucia, do grupo de Psicofarmacologia da USP, por exemplo, caracterizou a decisão da Fapesp de suspender a pesquisa como "equivocada".
A professora Maria Teresa disse ter recebido ontem à tarde telefonema do presidente da Fapesp, Carlos Vogt, comunicando-lhe a retomada do financiamento. A decisão foi tomada pelo Conselho Técnico-Administrativo da fundação, que levou em consideração relatório da comissão de sindicância designada para apreciar o caso e parecer do assessor científico.
"É uma dupla alegria: de um lado, poder concluir a pesquisa; de outro, ver a comunidade científica conseguindo que a Fapesp siga os seus procedimentos usuais, os mesmos que a consagraram como a importante agência que ela é."
A Folha tentou contato com Carlos Vogt. Foi informada que apenas o assessor Fernando Cunha se manifestaria sobre o assunto. Até as 22h15, Cunha não havia respondido às solicitações das informações.


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