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INCLUSÃO SOCIAL
Concurso da entidade Alfabetização Solidária avaliou redações de 510 mil inscritos em 1.050 municípios
Recém-alfabetizados escrevem sua história
DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL
A mão já está trêmula e a memória falha de vez em quando.
Mas Joaquim se concentra, segura
o lápis com força e escreve seu nome completo. Aos 81 anos, é a primeira vez que vê a própria letra.
Joaquim Reginaldo, ex-lavrador, ex-caminhoneiro, ex-pedreiro, 14 filhos, nove netos e quatro
bisnetos, mora no distrito de Antônio Pereira, a 30 quilômetros de
Ouro Preto (MG). Desde março,
começou a freqüentar o curso que
a entidade Alfabetização Solidária
(Alfasol) abriu na região e só faltou uma vez. É sempre o primeiro
a chegar para as aulas da professora Laurimar dos Passos, 24.
Mais do que assinar o nome, o
mineiro aprendeu a se expressar
por meio da palavra escrita e se
tornou o participante mais velho
do oitavo concurso de redação da
Alfasol, que hoje fará a premiação
dos melhores textos no Tom Brasil Nações Unidas, em São Paulo.
Em nove anos, 5 milhões de adultos aprenderam a ler e a escrever
por meio de projetos da entidade.
Neste ano, são 510 mil inscritos
em 1.050 municípios e que têm
aulas com 16 mil professores. Segundo o Censo 2000, havia 16 milhões de brasileiros analfabetos.
Joaquim não ficou entre os primeiros colocados, mas sabe que
escrever uma redação já é uma
grande vitória. "Meus filhos todos
se formaram, mas eu nunca tive
oportunidade de ir para a escola.
No começo do ano, estava sem fazer nada e resolvi estudar. Nunca
é tarde. A cabeça está fraca, mas
consegui aprender."
Em sua redação, Joaquim conta
que Antônio Pereira tem muitas
pedras preciosas, uma igreja incendiada e algumas prostitutas. O
concurso deste ano teve como tema "A comunidade onde moro" e
recebeu 614 redações de alfabetizandos e 184 de alfabetizadores de
todo o país. Há dois anos, os professores ganharam uma categoria
própria. O júri foi composto por
educadores e empresários. A comunidade participou votando pela internet no texto preferido.
A grande vencedora do júri oficial foi Izabel Santos da Conceição, 49, moradora de Santo Amaro das Brotas (SE) -leia o texto
vencedor no quadro ao lado. A cidade, segundo a última frase do
seu texto, é pequena no tamanho,
mas grande na solidariedade.
"Aqui todo mundo se ajuda muito, todos os vizinhos são amigos,
como se fossem da mesma família." Quando era menina, Izabel
parou de ir à escola ainda nos primeiros anos porque teve de ajudar a mãe a lavar roupa e sustentar a casa. Cresceu, casou, teve
cinco filhos, ficou viúva e continuou sem estudar.
No começo do ano, as professoras da Alfasol foram até sua casa
oferecer o curso e ela aceitou. "Eu
não sabia nem escrever meu nome. Quando não podia ir até a escola, a professora vinha na minha
casa e dava aula particular para eu
não perder nenhuma letra. Nem
acreditei quando ela me contou
que eu era a ganhadora do concurso." Na sexta-feira, Izabel também não acreditava que viajaria
de avião para receber o prêmio
em São Paulo. Na festa de hoje à
noite, terá outra grande surpresa:
os três textos vencedores serão lidos pelas atrizes Regina Duarte,
Marisa Orth e Nívea Maria.
Ana Marques Jardim, 71, de
Itaobim (MG), segunda colocada
no concurso, não conseguia parar
de chorar ao saber do resultado e
da viagem. "Quando era criança,
meu pai não me deixava ir para a
escola. Agora parece que estou
em um sonho." Ana conta que estuda bastante em casa para acompanhar sua turma. "Na minha
idade, a gente se esquece rápido
das coisas, mas devagar dá para
aprender. É só ter vontade."
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