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Relator da ONU ouve parentes de vítimas de violência
Familiares de pessoas assassinadas relatam ao australiano Philip Alston, em São Paulo, suspeitas de envolvimento de policiais
DANIEL BERGAMASCO
DA REPORTAGEM LOCAL
O australiano Philip Alston,
relator da ONU (Organização
das Nações Unidas) para casos
de execuções extrajudiciais, se
encontrou ontem em São Paulo
com representantes de ONGs e
pessoas que tiveram parentes
assassinados em circunstâncias ainda desconhecidas.
"Viemos ao Brasil por vários
motivos, depois que a ONU recebeu muitas denúncias de crimes cometidos por policiais",
afirmou ele à Folha, sem precisar números de denúncias. Ele
avisou aos jornalistas que só
dará entrevista ao final da viagem, prevista para durar 11
dias. Ele passará também pelo
Rio de Janeiro, por Recife e por
Brasília.
O termo "execução extrajudicial" só faz sentido em países
onde há pena de morte, e pessoas são mortas sem autorização da Justiça. No Brasil, onde
não existe autorização "judicial" para matar, o termo
abrange assassinatos em geral.
O encontro com familiares
de vítimas aconteceu em sala
reservada na sede do Sindicato
dos Jornalistas, no centro de
São Paulo, na tarde de ontem.
Quase todos saíam da conversa
às lágrimas, após relatar em detalhes, com a ajuda de uma tradutora de inglês, as mortes de
seus parentes.
Alston evita divulgar seu roteiro de reuniões por discrição,
para evitar repetir a visita de
Asma Jahangir, em 2003,
quando uma testemunha foi
assassinada três dias após se
encontrar com a relatora.
Quase todos os parentes das
famílias presentes foram mortos durante a onda de crimes
iniciada por ataques do PCC
(Primeiro Comando da Capital), segundo elas próprias. Dos
oito ouvidos pela Folha, todos
diziam ter convicção ou suspeita de que seus parentes foram
mortos por policiais.
Uma estudante cujo irmão
desapareceu em maio do ano
passado contou que o DHPP
(Departamento de Homicídios
e Proteção à Pessoa) a convocou para dar notícias sobre o
caso. "Mesmo que seja uma notícia ruim, pelo menos vai acabar com essa incerteza da nossa família, que dói tanto", disse.
Uma outra testemunha de
interior, que contou ter perdido dois parentes na onda de
ataques de maio do ano passado, disse à ONU que policiais
costumam atemorizar jovens
em sua cidade dizendo frases
como "Espalhem essa rodinha!
Olha o carro preto chegando" e
"os Ninjas estão vindo aí".
Depois da visita
Após falar com testemunhas
e ONGs do Brasil, o relator Philip Alston deverá apresentar
um relatório à ONU sobre as
denúncias. A famílias dizem ter
esperança de que a entidade
possa pressionar o Brasil a investigar melhor os crimes e evitar que novos aconteçam.
Representantes de ONGs estavam mais céticos. "A ONU
tem se mostrado inoperante.
Sabe dos conflitos do Sudão,
dos palestinos, mas não faz
muita diferença. Mas, enfim,
somos persistentes. Esperamos que eles pelo menos tomem conhecimento da situação que estamos vivendo no
Brasil", disse Miguel Varoni, do
grupo Tortura Nunca Mais.
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