São Paulo, segunda-feira, 06 de janeiro de 2003

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SAÚDE

Estudo da Faculdade de Saúde Pública da USP em SP mostra que a maioria dos alimentos está imprópria para o consumo

Pesquisa reprova self-service após as 14h

Beto Rocha/Folha Imagem
Clientes se servem em balcão de restaurante self-service que vende comida por quilo; pesquisa aponta riscos de contaminação


CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Almoçar em restaurantes self-service na cidade de São Paulo entre as 14h e as 15h pode significar um risco à saúde. Nesse horário, a maioria dos alimentos disponíveis nos estabelecimentos está imprópria para o consumo devido ao longo tempo de exposição a uma temperatura inadequada.
Essa é uma das principais conclusões de pesquisa feita pela Faculdade de Saúde Pública da USP em 20 restaurantes da capital paulista. Foram colhidas 80 amostras de alimentos em três horários diferentes: das 11h45 às 13h, das 13h às 14h e das 14h às 15h.
No último horário, que se aproxima do final do expediente para servir almoço, 79,55% das amostras de alimentos estavam impróprias para o consumo porque foram processadas ou mantidas no balcão de maneira inadequada.
Das 44 amostras recolhidas nesse período, 34 apresentavam coliformes fecais -que funcionam como indicadores de higiene-, algumas com índices até 10 milhões de vezes acima dos padrões microbiológicos aceitáveis.
Duas das principais bactérias que causam intoxicações alimentares, a Salmonella ssp e a Escherichia coli, foram encontradas em amostras recolhidas entre as 14h e as 15h. Os sintomas mais comuns das doenças transmitidas por alimentos impróprios para o consumo são diarréia e vômito. Em casos mais graves, as reações podem levar à morte.
Segundo o médico sanitarista Alexandre Panov Momesso, 29, que fez o estudo como tese de mestrado, os resultados indicam que muitos alimentos já saem contaminados da cozinha, devido à manipulação inadequada ou falta de higiene, e sofrem uma elevada multiplicação bacteriana em razão do longo tempo de exposição no restaurante a uma temperatura inadequada.

Temperatura
Apenas 12,5% das amostras recolhidas para a pesquisa encontravam-se em temperaturas ideais. Os alimentos quentes deveriam ficar a uma temperatura superior a 60ºC e os frios, a menos de 10C. Essas temperaturas impedem que as bactérias se multipliquem, diminuindo a possibilidade de intoxicações alimentares.
Segundo Momesso, os proprietários dos restaurantes alegaram desconhecer a temperatura adequada para conservar os alimentos frios e os quentes. Para a Semab (Secretaria Municipal de Abastecimento), o argumento é "injustificável" porque os donos de restaurantes passam por um treinamento básico antes de conseguir o alvará de funcionamento.
Além da temperatura inadequada, o médico afirma que a reposição da comida exposta é feita de maneira errada. Quando determinado alimento chega ao fim no balcão expositor, os funcionários dos restaurantes simplesmente jogam uma nova quantidade por cima dele, em vez de lavar ou trocar as bandejas. Uma pessoa que vai almoçar no final do expediente provavelmente vai comer parte do que foi colocado na bandeja pelo menos quatro horas antes, tempo suficiente para que ocorra a multiplicação das bactérias.
"Tem bife que conta a história da pessoa", afirma o microbiologista e biomédico Roberto Martins Figueiredo, 47, referindo-se ao longo tempo de exposição dos alimentos nos restaurantes. Soma-se a isso o fato de as pessoas falarem perto das bandejas e até mesmo tocarem nos alimentos na hora de se servir, ainda que acidentalmente, o que aumenta as chances de uma contaminação cruzada, ou seja, provocada por um agente secundário.
Para Momesso, o ideal seria que houvesse balcões protegidos. Do total de restaurantes pesquisados, 55% eram balcões completamente abertos. Momesso também considera importante a colocação de pias para a lavagem de mãos em locais estratégicos para evitar que as pessoas contaminem os alimentos expostos. Apenas 4 dos 20 restaurantes pesquisados dispunham desse item.
Segundo o microbiologista Roberto Figueiredo, um bom indicativo para saber se o restaurante está cumprindo as normas, no que diz respeito à temperatura, é o vapor saindo das bandejas. "A temperatura do banho-maria deve ficar entre 80ºC e 90ºC para que os alimentos mantenham os 60ºC."
Outro detalhe que os consumidores podem observar é se os balcões dispõem de barreiras (tampa de vidro, por exemplo) que protejam os alimentos de saliva e fios de cabelo, por exemplo.
Figueiredo afirma que muitas vezes as pessoas não relacionam um mal-estar a uma intoxicação alimentar porque o período de incubação de algumas bactérias patogênicas pode demorar até 72 horas. "Ninguém lembra do que comeu há três dias", diz.
Além disso, segundo ele, algumas doenças veiculadas por alimentos têm sintomas diferentes aos clássicos diarréia e vômito. Uma delas, por exemplo, provocada pela bactéria Staphylococus fecalis, pode causar febre e dores no corpo durante uma semana.


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