São Paulo, sexta, 6 de março de 1998

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JUSTIÇA
Para tribunal, crime é lesão corporal seguida de morte, com pena de até 12 anos de prisão; promotoria diz que recorrerá
Fogo em índio não foi homicídio, diz TJ

BETINA BERNARDES
da Sucursal de Brasília

A 2ª turma criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiu ontem por unanimidade que o crime contra o índio pataxó Galdino Jesus dos Santos não foi homicídio qualificado.
Com a decisão, o advogado de Max Rogério Alves, um dos quatro acusados que estão presos, disse que vai pedir a soltura do seu cliente. Os advogados dos outros três disseram que não vão pedir sua libertação. A promotoria anunciou que vai entrar com recurso especial no Superior Tribunal de Justiça contra a decisão.
A decisão da 2ª turma foi tomada em resposta a recurso da promotoria, que não foi atendido. Na madrugada do dia 20 de abril de 97, o índio teve seu corpo incendiado (leia texto abaixo).
Cinco jovens confessaram que atearam fogo em Galdino: Max, Antônio Novély Cardoso de Vilanova, Tomás Oliveira de Almeida, Eron Chaves de Oliveira e o menor G.N.A.J., na época com 16 anos.
A promotora Maria José Pereira acusou os maiores de idade de homicídio triplamente qualificado: motivo torpe, emprego de meio cruel e uso de recurso que impediu a defesa da vítima. A pena máxima para o crime é de 30 anos.
A defesa alegou que os rapazes não tinham intenção de matar e pediu a classificação do crime como lesão corporal seguida de morte, cuja pena máxima é de 12 anos de prisão, com direito a progressão para regime semi-aberto.
Sandra de Santis, presidente do Tribunal do Júri, decidiu classificar o crime como lesão corporal seguida de morte em agosto de 97. A promotoria recorreu da decisão e ontem três desembargadores votaram o recurso.
O relator, desembargador Joazil Gardes, fez uma exposição sobre a condenação de Jesus Cristo antes de entrar no mérito do caso pataxó. Depois, disse que há no país uma "mídia sensacionalista, que estabelece premissas e impõe a conduta popular". Segundo o relator, "de modo algum (os acusados) agiram prevendo a morte, estavam movidos pelo ânimo de brincar, não de matar".
O relator disse que a queimadura nem sempre mata e que a prova disso é que há milhares de pessoas vivas vítimas de queimaduras.
"Pôncio Pilatos cedeu aos gritos populares. As pressões da mídia e da opinião pública por ela manipulada são intensas, mas não me fizeram considerar o crime como homicídio doloso", afirmou.
O presidente da 2ª turma criminal, Getúlio Pinheiro, acompanhou o relator e também criticou a mídia em seu voto. Disse que os meios de comunicação, nesse caso, "não informaram, mas sim formaram a opinião pública". Disse que era um defensor do Tribunal do Júri (que julga homicídio), mas que os jovens não agiram com o propósito de matar. "Eles adquiriram dois litros de álcool. Se quisessem matar, teriam usado o conteúdo dos dois recipientes." A desembargadora Aparecida Fernandes acompanhou o voto.



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