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BARBARA GANCIA
São Paulo está órfã do rabino
É sábia a ironia da máxima popular que diz que "pobre quando rouba é ladrão, e rico tem problemas psicológicos"
APOSTO UM picolé de limão que
hoje, em São Paulo, milhares
de pessoas como eu -sejam
elas judias, cristãs, muçulmanas, budistas, descrentes ou praticantes do
zoroastrismo- estão se sentindo órfãs do rabino Henry Sobel.
Ao longo dos anos, aprendi a admirar a postura conciliatória do rabino, sua sabedoria e a posição corajosa que tomou na época do regime
militar. Henry Sobel sempre foi um
orgulho para os habitantes da cidade, uma benção para São Paulo.
Em março de 2000, escrevi uma
coluna falando de Israel, para mim o
país mais deslumbrante que já conheci, e o rabino retribuiu com um
carinhoso bilhete: "Quero apenas
que você saiba que aprecio imensamente seus artigos. O de 22 de março, sobre a viagem do papa a Israel,
foi divino! Que Deus a abençoe". Até
a última sexta-feira, a mensagem estava na minha parede.
Mas, algo terrível se passou com
Henry Sobel e, na semana passada, o
paulistano descobriu que o líder da
comunidade judaica, figura que
sempre atuou como baliza moral em
situações críticas, foi detido pelo
furto de quatro gravatas.
Por tudo que o rabino representa,
muitas foram as vozes que se apressaram em perdoar o homem, Henry
Sobel. É muito justo que seja assim,
e só quem nunca cometeu um tropeço pode condenar toda uma biografia por conta de um gesto isolado.
Acontece que, logo depois do
ocorrido, ao ser interpelado a comentar o fato no site de notícias G1,
da Globo, Sobel agiu com soberba e
negou tudo. Disse, textualmente,
quando indagado sobre o furto:
"Claro que não é verdade. Estive nos
EUA, mas não fui preso". Ainda sem
saber que o boletim de ocorrência
com sua foto já estava na internet,
ele insistiu: "Nada disso é verdade. A
notícia é sensacionalista. Não sou eu
na foto, garanto. Vou tomar providências".
Depois, surgiu a versão de que ele
estaria sofrendo do mal de Parkinson e teria alterado as dosagens dos
medicamentos que lhe foram prescritos. E as cartas de membros proeminentes da comunidade prestando
solidariedade ao rabino continuaram a chover nas Redações.
Pois algo me diz que as pessoas
que perdoaram Henry Sobel com
tanta facilidade querem mais é tentar, no fundo do âmago, negar seus
próprios defeitos. Ou será que as prisões tapuias não estão coalhadas de
pais e mães que furtaram para dar de
comer aos filhos?
Por mais que eu simpatize com
Sobel, o admire e seja infinitamente
agradecida por tudo o que ele já fez,
sou obrigada a concordar com a ironia da máxima popular que diz que
"pobre quando rouba é ladrão, e rico
tem problemas psicológicos". O que
o rabino fez é gravíssimo.
Veja só: no caso de Sobel estar tomando algum remédio de embalagem com tarja preta, como é que ele
foi ao shopping (em que o furto teria
ocorrido) ao volante de um Toyota
Avalon? Nas bulas desse tipo de remédio não há um aviso claro de que
não se deve dirigir ou mexer com
maquinário quando se está sob efeito da medicação? E se, em vez de furtar gravatas de marcas grã-finas (ai,
esse materialismo que corrói o espírito!), ele tivesse atropelado uma
criança, quem teria se responsabilizado? De fato, caro rabino, "é muito
difícil explicar o inexplicável".
barbara@uol.com.br
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