São Paulo, sexta-feira, 06 de junho de 2008

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BARBARA GANCIA

Tiro pela culatra

Não é por conta de atitudes como a do sargento que a presença de homossexuais é malvista nas Forças Armadas?

ISRAEL, REINO UNIDO, Canadá, Suíça e Austrália são alguns dos países em que a questão dos homossexuais nas Forças Armadas já foi amplamente debatida, digerida e resolvida. Nesses lugares, gays e lésbicas estão livres para servir e, ao mesmo tempo, têm seus direitos preservados por lei.
Nos países árabes, o assunto nem sequer é colocado em discussão e, em locais como Rússia, Turquia, Coréia do Sul e Líbia, os gays não podem, por lei, seguir carreira militar.
Nos EUA, a questão continua em aberto. Até 1993, a lei dizia o seguinte: "O homossexualismo é incompatível com o serviço militar. A presença em ambiente militar de pessoas que praticam conduta homossexual ou que, por meio de suas afirmações, demonstram propensão para a prática de conduta homossexual, compromete seriamente o cumprimento da missão militar".
Bill Clinton redirecionou a controvérsia ao introduzir o ato que ficou conhecido como "don't ask, don't tell" (não pergunte, não diga), que admite homossexuais, mas os proíbe de revelar sua preferência, e o comando militar de investigar a sexualidade dos seus comandados. Atualmente, o Congresso norte-americano estuda um novo ato, que admite, sem restrições, os homossexuais e ainda promete garantir plenamente os seus direitos. Já aqui na terrinha, como era de se esperar, a questão virou galhofa. A história da prisão por suposta deserção do sargento Laci Marinho de Araújo, gay assumido, enquanto gravava o programa "Superpop", fez mais gente rir do que se aprofundar na questão de se homossexuais devem ou não ter os mesmos direitos do restante da população.
Mas, vem cá: dava para ser diferente? Como é que a gente vai se compadecer com o sargento, que se diz perseguido por comandantes preconceituosos, quando o próprio, num arroubo de candura, afirma que "as Forças Armadas são um paraíso", pois não há, segundo ele, "coisa melhor para um homossexual do que tomar banho com um monte de homem pelado e sarado"?
Ora, não é justamente por conta desse tipo de pensamento que a presença dos homossexuais é malvista nas Forças Armadas?
Confesso que, ao tomar conhecimento da declaração do sargento Laci, a primeira coisa que me veio em mente foi a imagem do referido militar passeando pela caserna de pênis ereto. E olha que eu não sou nenhuma carola, não tenho nada contra o Village People, adoro a Cher e a Liza Minnelli, os musicais da Broadway e já aplaudi de pé muito número de transformista imitando a Bethânia.
O que eu quero dizer é que, em vez de elevar a discussão ao degrau que ela mereceria, a história do sargento Laci só serve como exemplo para aprofundar o preconceito e mostrar aos contribuintes, cujos impostos sustentam as Forças Armadas, que os homossexuais não têm temperamento adequado para servir.
Um pouco como a Parada Gay de São Paulo que, para muitos, virou sinônimo de dia em que o sexo está liberado para ser praticado no meio da rua (há inúmeros relatos de gente que vive no entorno das avenidas Paulista e Rebouças atestando que, neste ano, a farra passou dos limites), o drama do sargento Laci mais prejudica do que ajuda a causa pelos direitos dos homossexuais.


barbara@uol.com.br

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