|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Alunos e prostitutas disputam espaço na av. Indianópolis
Muros de escola estadual na zona sul são usados como apoio para maquiagem de travestis à espera de clientes
Local é antigo reduto de prostituição na cidade, que cresceu nos últimos tempos; os alunos, de 15 a 19 anos, veem tudo
VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
MOACYR LOPES JÚNIOR
DE SÃO PAULO
Os muros da escola estadual Professor Alberto Levy
não são bem uma penteadeira, mas servem de apoio para
bolsas, casacos, sombrinhas,
escovas e maquiagem.
Enquanto Rebeca, a dona
da bolsa, acomoda o pênis
para trás na calcinha fio-dental, escorada no portão, a sirene toca nervosa para que
os alunos entrem na aula.
São 19h, carros buzinam,
ônibus param no ponto e o
tráfego é intenso na avenida
Indianópolis (zona sul de
São Paulo), um antigo reduto
de prostituição de travestis.
Nos últimos tempos, o
ponto cresceu e tomou o entorno do colégio. Os alunos
-que têm entre 15 e 19 anos e
estão no ensino médio-
veem tudo: da negociação ao
exibicionismo das partes sexuais para atrair os clientes.
As meninas dizem não poder andar sozinhas ou em
grupos porque motoristas
param para abordá-las.
"É comum ver os travestis
pelados ou só de calcinha.
Antes não ficavam na porta
da escola, mas agora é direto", afirma Camila Santos,
19, aluna do 1º ano.
"No começo fiquei amedrontada. Eles não gostam
de ser afrontados. Só de olhar
nos ameaçam. Não sabemos
mais o que fazer. Estou aqui
há três anos e nunca houve
nenhuma reunião para tentar resolver esse problema",
diz Mercedes Ribeiro, professora de português.
PONTO VALORIZADO
Segundo os travestis, o
ponto na escola é valorizado
porque enfrentam menos
violência e têm uma referência para dar aos clientes marcados por telefone.
Cobram de R$ 60 a R$ 150
-para carros importados e
homens mais velhos é mais
caro- por programas que
não duram mais de 20 minutos num motel próximo ou
nas ruas escuras do bairro.
"Os policiais até passam e
mandam os travestis saírem,
mas pouco tempo depois voltam", afirma Zuleide Barbosa, inspetora dos alunos.
Na porta da escola, o PM
Romildo diz que "moralmente é errado", mas não pode levá-los à delegacia porque
prostituição não é crime.
Para a doutora em Ciências Sociais Larissa Pelucio,
pesquisadora do Núcleo de
Estudos de Gênero da Unicamp, muitos deles gostariam de estar na escola e a
"imagem de perigo e de
ameaça é uma proteção".
"A escola poderia começar
mostrando algo que os
atraísse, mostrando que não
é hostil. Mostrar o pênis é
uma micropolítica de resistência e uma tentativa de se
proteger", diz Pelucio.
A Secretaria da Educação
do Estado diz que não há nada a fazer porque ocorre fora
dos muros da escola.
O Conselho Municipal da
Criança e do Adolescente
afirma que o caso não é de
atribuição do conselho tutelar. E o Ministério Público diz
que age a partir de denúncia.
Em uma linha, a Polícia
Militar diz que "intensificará
o policiamento no local e realizará operações".
Na calçada do colégio, um
travesti negocia um encontro
ao celular. "Estou em frente à
escola, de miniblusa preta e
shorts jeans", diz.
A reportagem o aborda e
pede um instante de conversa. "Só falo por dinheiro. Vai
pagar?" Melhor não.
Texto Anterior: Foco: De dia, ela é a professora Bianca; à noite, Bianca Exótica Próximo Texto: Análise: As escolas já não são mais o templo sagrado do saber Índice
|