São Paulo, segunda-feira, 06 de junho de 2011

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ANÁLISE

Os pecados de compra e venda de dados sigilosos oficiais

GUARACY MINGARDI
ESPECIAL PARA A FOLHA

No ano de 1995 a Assembleia Legislativa de São Paulo iniciou uma CPI para investigar o crime organizado e suas ligações com o aparelho do Estado.
Um dos primeiros alvos foi o Detran, onde se supunha haver envolvimento de funcionários com o crime. Sobre a relação deles com organizações criminosas, nada foi descoberto, porém quanto à ligação com organizações legais ou que trabalham na margem da legalidade, muitos fatos foram levantados.
O que mais chamou atenção foi que empregados de recuperadoras de veículos tinham acesso ao banco de dados do Detran, ou seja, tinham uma senha oficial e a permissão para pesquisar nesse sistema.
Além disso, surgiram denúncias sobre envolvimento de servidores com despachantes, seguradoras etc.
Por isso as denúncias recentes não são exatamente uma novidade, apenas outra versão do mesmo problema, a falta de distinção entre o público e o privado que impera em vários setores do serviço público brasileiro, onde obter vantagens por intermédio do cargo que ocupa é a regra, não a exceção.
Na cultura policial a cessão de informações privilegiadas, ou mesmo a venda, para determinadas empresas, nunca foi vista como falta grave, apesar de ser ilegal.
Muitos policiais que se consideram honestos fizeram disso uma fonte de renda extra.
Já o acerto com o criminoso sempre foi avaliado como mais nocivo, coisa feita por corruptos.
A ideia é que negociar com as "pessoas de bem" é apenas um pecadinho venial, quase que sem importância.
E os que são pegos sempre se defendem alegando que é um caso irrelevante, um crime sem vítima.
O que é incorreto, porque a vítima é a sociedade, que paga impostos para obter serviço de primeira, mas ele só está à disposição de alguns que pagam por fora.
Há cerca de 200 anos, o Ocidente apostou na criação de um serviço público que fosse neutro, profissional e especializado.
No Brasil essa história tem menos de cem anos. Talvez por isso o trabalho ainda esteja pela metade. Temos profissionais especializados, falta alcançar a neutralidade.

GUARACY MINGARDI é cientista político e especialista em segurança pública


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