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PATRIMÔNIO
Prefeitura quer retornar a obra para o Pacaembu
Mudança da réplica da estátua de "Davi" causa polêmica no Tatuapé
SÉRGIO DURAN
DA REPORTAGEM LOCAL
Foi um ano de reclamações de
moradores e opiniões divididas,
mas a réplica da escultura "Davi",
de Michelangelo (1475-1564), deixará mesmo o bairro do Tatuapé,
na zona leste de São Paulo.
Após 27 anos nos quais enfeitou
a frente do Centro Educativo, Recreativo e Esportivo do Trabalhador (Ceret), a estátua retornará ao
seu endereço original, no estádio
do Pacaembu (zona oeste).
"Já deu para perceber que isso
provocará uma reação traumática. A atitude reflete a visão da prefeitura, que enxerga na zona leste
uma espécie de depósito", protesta a presidente de uma das associações de moradores do Tatuapé,
Silvia Calçada. "Quando não tinham onde a colocar, aqui serviu.
Agora que faz parte da paisagem e
da nossa história, tchau."
Desde que saiu a notícia da mudança, não há outro comentário
no bairro. O jornal "Gazeta do Tatuapé", distribuído gratuitamente
há 20 anos, recebe cartas de protesto quase diariamente.
"Há um pouco de exagero.
Acho que descobriram o "Davi"
agora que ele está indo embora",
considera a professora aposentada Suely da Costa, que mora perto
do Ceret há 35 anos.
Estado x prefeitura
Na primeira tentativa de retirá-lo, há dois meses, houve confusão. Funcionários da prefeitura
foram impedidos pelo diretor do
Ceret, Antônio Raphael de Vita. A
situação se complicou porque o
centro recreativo é administrado
pelo governo do Estado, e a estátua é um bem municipal.
Quem reclama os direitos pela
escultura é o administrador do
Pacaembu, Olívio Pires Pitta. "É
um patrimônio do estádio. Nunca
deveria ter saído daqui", afirma.
Segundo Pitta, o retorno de
"Davi" faz parte de um projeto de
resgate da memória do Pacaembu. Ele só não tentou retirar a estátua novamente porque quer
evitar o trauma. "Procuro outra
escultura para colocar na frente
do Ceret. Sei que há outras réplicas de "Davi", mas aquela é nossa."
Segundo a socióloga Fátima
Antunes, do Departamento do
Patrimônio Histórico da prefeitura, a reação popular deve ser observada. "É difícil verificar esse
apego", afirma. Apesar de ser o
órgão competente, o DPH não foi
consultado antes da decisão. O
departamento é contra a transferência de esculturas. "Pelo simples fato de que uma estátua não
deve andar pela cidade", explica.
A réplica do "Davi" de Michelangelo não tem valor artístico,
apenas sentimental. Com 5 m de
altura, como a original, que fica
em Florença (Itália), a escultura
foi feita em argamassa pelo Liceu
de Artes e Ofícios no anos 30.
Há outras cópias de obras de
Michelangelo espalhadas pela cidade, como "Moisés", na Galeria
Prestes Maia. A estátua que enfeita o Ceret foi colocada no Pacaembu antes da inauguração, em
1940, pelo então prefeito Prestes
Maia (1939-1945).
Tanguinha
Na pesquisa feita pela socióloga,
constatou-se que "Davi" -escultura de um homem nu- constrangia um pouco os frequentadores do estádio. A estátua ficava
na frente da antiga concha acústica, e foi despejada durante a construção do tobogã, em 1969.
"Nos desfiles de 7 de Setembro,
feitos no estádio, cobriam a escultura com uma tanguinha", conta
Fátima. Na comparação entre o
"Davi" de Florença e o do Tatuapé, é possível perceber que o segundo tem o pênis consideravelmente maior. "Talvez seja por isso", diz Fátima Antunes. A vantagem do "Davi" brasileiro, porém,
foi prejudicada durante os anos
em que ficou na zona leste: parte
da genitália foi arrancada.
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