São Paulo, quarta-feira, 06 de outubro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

AIDS

Estudo indica que alterações metabólicas levam a aumento de gordura no sangue

Coquetel aumenta risco de infarto

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Estudos realizados pelo Incor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas de São Paulo) e por centros de pesquisa norte-americanos mostram que os coquetéis de medicamentos contra o HIV podem provocar alteração degenerativa da camada íntima das artérias (aterosclerose), aumentando o risco de doenças cardiovasculares (derrames e infartos).
Entre os efeitos dos medicamentos anti-retrovirais -que, combinados, bloqueiam a proliferação do vírus e controlam a evolução da Aids- estariam alterações metabólicas que causam a diminuição das taxas de HDL (colesterol bom) e o aumento dos níveis de colesterol ruim e de triglicérides (gordura no sangue).
Dados do Programa Nacional de DST e Aids, do Ministério da Saúde, mostram que 40% dos pacientes que utilizam a terapia retroviral apresentam efeitos adversos, entre eles o aumento do colesterol ruim e do triglicérides. Não há levantamento, porém, do número de pacientes com doenças cardiovasculares já instaladas.
Segundo o cardiologista e pesquisador da USP Bruno Caramelli, com apenas um ano de uso da medicação já pode ocorrer um espessamento da camada íntima das artérias carótidas. Ele apresentou os trabalhos no Congresso Brasileiro de Cardiologia, ocorrido na semana passada no Rio.
"A epidemia de Aids poderá, em curto espaço de tempo, aumentar a incidência de doenças cardiovasculares", diz Caramelli.

Mudança de estilo de vida
Além dos efeitos adversos dos anti-retrovirais -especialmente com os medicamentos do grupo de inibidores de protease-, o pesquisador acredita que a infecção crônica causada pelo HIV e outros hábitos de vida freqüentes entre os portadores do HIV, como o tabagismo e a vida sedentária, contribuam para esse aumento das doenças ateroscleróticas.
Como o coquetel é fundamental para a sobrevivência dos pacientes, Caramelli defende alterações no estilo de vida que podem compensar os efeitos colaterais, como o combate ao tabagismo -56% dos infectados fumam- e à dislipidemia (alteração nos níveis de lipídios), que atinge 45% deles.
O pesquisador diz que, se os objetivos não forem alcançados com as mudanças de estilo de vida, a associação de medicamentos, como os fibratos, pode ser considerada. O uso das estatinas (para reduzir o colesterol ruim) deve ser cuidadoso, pois pode provocar efeitos colaterais graves.
Segundo o infectologista David Uip, da diretoria do Incor, é possível ministrar a pacientes com riscos cardiovasculares outros tipos de remédio -como nucleotídeos e não-nucleosídeos- que causam menos efeitos aterogênicos.
O médico Ronaldo Hallal, do Programa Nacional de DST e Aids, afirma que os pacientes com HIV já são alertados para os riscos cardiovasculares dos anti-retrovirais e recebem orientações para o controle dos níveis de colesterol e triglicérides.
Também, sempre que possível, é feita a substituição por drogas que provocam menos efeitos colaterais, segundo Hallal. Ele diz que, embora não haja um mapeamento de doenças cardiovasculares associadas ao uso do coquetel, já existem relatos de eventos desse tipo como angina no peito, infarto agudo do miocárdio e derrames em pacientes jovens que, em tese, não teriam outros fatores de risco associados.
Até 2003, o Ministério da Saúde havia notificado 310,3 mil casos de Aids no Brasil. Desde 1999, a taxa de mortalidade pela doença se mantém estabilizada no país: 6,3 óbitos por 100 mil habitantes.


Texto Anterior: Efeito colateral: Ação reúne 300 mil contra o Vioxx nos EUA
Próximo Texto: Estradas: Impacto ambiental do Rodoanel é debatido
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.