São Paulo, terça-feira, 06 de outubro de 2009

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CECILIA GIANNETTI

Flash Forward 2016


2016 sempre esteve ali, mas viver a transformação da cidade já é como viver num futuro que não imaginávamos possível

UM DOS MAIORES SUCESSOS mundiais recentes da televisão, o seriado "Lost", acaba em 2010; mas já tem candidato a substituto em sua categoria, a ficção científica de "Flash Forward", já lançada nos EUA e, no Brasil, também já vista pelos internautas mais "safos" na prática de baixar filmes e séries de graça pela web, condenada pela MPAA (Motion Picture Association of America).
"Flash Forward" se desdobra a partir de um evento inexplicável: todos os habitantes da Terra, durante 2 minutos de 17 segundos, caem adormecidos -ao volante, pilotando e viajando em aeronaves, descendo uma escada, atravessando uma rua cheia de carros guiados por pessoas igualmente "apagadas" etc. Os que sobrevivem ao caos instaurado em todo o planeta após os inúmeros acidentes que o apagão provoca reportam visões e sensações muito nítidas experimentadas naqueles 2 minutos e 17 segundos -nada como meros sonhos. Tendo cada pessoa "visto" onde, com quem e o que estaria fazendo num futuro próximo, imediatamente todos começam a cruzar informações detalhadas sobre o que viram através de todas as mídias disponíveis, e conversando com vizinhos, amigos, parentes, até mesmo desconhecidos; a maioria postando suas visões na internet para comparar os supostos fatos. Muitas peças se encaixam, o que é bom para alguns e terrível para outros. Exemplos ("spoilers"): o casal que se ama, tem filhos e uma vida perfeita, e, comparando suas visões, confirma que estará com outras pessoas, que os dois ainda não conhecem, dentro de seis meses. O alcoólatra recuperado que -ele vê! sente!- volta a beber. Ou aquele que, um dos poucos que nada viu ou experimentou, conclui que estará morto -o que é confirmado por quem leu num jornal do futuro a manchete sobre seu assassinato.
Uma direção única para o "flash forward", o ponto para o qual avançaram as mentes no futuro, é descoberto com facilidade: vários relatos são de pessoas que se viram segurando periódicos, a data bem marcada, ou assistindo ao noticiário, e confirmam unanimemente -em suas visões, estavam seis meses adiante.
A saga é uma adaptação para a TV do livro homônimo de Robert J. Sawyer, com várias diferenças. Dentre elas, no texto original do autor canadense, a humanidade durante o apagão se vê dali a 21 anos.
Quando, na sexta-feira passada, o Rio de Janeiro foi anunciado sede das Olimpíadas de 2016, algo parecido aconteceu com muitos de nós, que vimos além da alegria que essa vitória representa e que enxergamos além da necessária preocupação com a verba a ser empregada na viabilização do maior evento esportivo nesta cidade que, sim, tem problemas mil.
A família reunida no sofá em frente à televisão vibrou com a notícia, é Rio 2016! A avó, de 79 anos, vibrou junto; até se dar conta: em sete anos, terá 86... se estiver viva. E uma tristeza, quase uma certeza, desceu sobre ela, como se realmente se enxergasse morta num "flash forward" de 2016. Uma amiga, até então firme na convicção de que não teria filhos, confessa que pensa agora em engravidar, por ter pela primeira vez vislumbrado uma vida sem família aos 40 anos. O gatilho? Rio 2016.
O ano de 2016 sempre esteve ali. Mas viver a transformação da cidade -obras, segurança, transportes, economia- in loco ao longo desses sete anos será -já é- como viver num futuro que não imaginávamos possível. É um "flash forward" legítimo causado pelas transformações por que a cidade e os cariocas passarão, a começar por uma mudança de fato impactante: a retomada de nossa autoestima e esperança.


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