São Paulo, quarta, 7 de janeiro de 1998.



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Grupo tenta mudar lei e evitar comércio

AURELIANO BIANCARELLI
e LUCIA MARTINS

da Reportagem Local

A nova lei de transplantes pode facilitar o comércio de órgãos e, mesmo assim, reduzir as chances de doações de rins entre não-parentes. A opinião é dada por médicos especializados e pela direção da ABTO (Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos).
Na antiga lei, a doação de órgãos feita por doadores vivos não-parentes era possível com uma autorização judicial. A atual lei derrubou essa exigência, mas determinou que o doador tenha quatro antígenos (substâncias que causam a formação de anticorpos) compatíveis com o receptor.
"A antiga lei era melhor. Essa mudança não evita o risco de comércio e ainda atrapalha as doações de não-parentes", diz o presidente da ABTO, Valter Garcia.
"Isso derruba qualquer possibilidade de doação entre não-parentes, pois essa compatibilidade só ocorre em um em cada grupo de 10 mil doadores", diz Luiz Estevam Ianhez, chefe da unidade de transplante de rim do Hospital das Clínicas de São Paulo.
Por causa disso, a ABTO pretende se reunir hoje com representantes do Ministério da Saúde para apresentar sugestões de alterações da lei. Entre elas, a volta da exigência de autorização judicial para transplante entre pessoas vivas não-parentes.
Para evitar "o pior risco", que é o comércio de rins, os centros de transplantes do Rio Grande do Sul estão evitando fazer transplantes de rins entre pessoas vivas não-parentes, diz Garcia.
Mas, para Ianhez, esse tipo de restrição é um retrocesso. "Enquanto no Primeiro Mundo estimula-se a doação entre não-parentes, a atual lei vem restringir essa possibilidade."
Segundo Ianhez, a opção por doadores parentes, no caso do rim, é uma exigência legal e não médica. Um paciente que recebe um rim de um não-parente tem apenas 5% mais de riscos de rejeição do que aquele que recebe de um parente. No caso de rim de cadáver, esse risco chegaria a 10%.
"Eu defendo doações entre parentes e não-parentes", diz. "É uma fonte que pode significar mais 10% das doações. Só temos que impedir o comércio de órgãos, o que a lei anterior garantia ao exigir uma autorização judicial."
Ianhez diz que, um mês depois de sancionada a lei, em agosto passado, ele obteve autorização judicial para um paciente que estava sendo preparado para receber o rim de uma amiga. "O paciente já corria risco de vida, e o juiz entendeu que a amiga poderia doar."
Ianhez diz que o doador vivo não corre riscos com a retirada de um dos seus rins. "Em 25 anos, nunca perdemos um doador em decorrência da cirurgia." Nesse tempo todo, Ianhez diz que sua equipe já realizou 2.500 transplantes de rins no HC e no Hospital Osvaldo Cruz.
"Retirar um rim não prejudica ninguém", diz. "Do ponto de vista médico, o doador precisa apenas ter mais de 25 anos e menos de 65, e estar em boa saúde." A retirada do rim exige quatro dias de hospitalização e em três semanas o doador pode voltar ao trabalho.



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