São Paulo, domingo, 07 de março de 2004

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"Quero voltar de cabeça erguida"

DA REPORTAGEM LOCAL

Aos 12 anos, ele já bebia escondido dos pais. Aos 14, experimentou cocaína e maconha a convite de amigos. Aos 16, começou a furtar objetos do pai, um comerciante de São José dos Campos (SP), para comprar drogas. Aos 17, foi preso por assalto, mas conseguiu se livrar da Febem prestando serviços à comunidade.
Em seguida, começou a participar de reuniões no NA (Narcóticos Anônimos), onde diz ter permanecido "limpo" durante dois anos. Em 1997, foi contratado como mecânico estrutural de aeronaves pela Embraer.
"Com dinheiro na mão, cai em tentação. Comecei a usar maconha e cocaína nos finais de semana. Tinha certeza de que estava controlando a situação", relata Paulo, 27, (o nome é fictício), que está há dez dias internado em uma clínica de recuperação de dependentes químicos em São José. O tratamento, de 35 dias, está sendo custeado pela Embraer.
Quatro meses após a contratação, com a namorada grávida, resolveu se casar e abandonar, por conta própria, as baladas de finais de semana. Decidiu cursar direito e voltar a jogar futebol. "Fiquei mais três anos limpo", diz Paulo.
Limpo, mas não muito. Após uma bebedeira, espancou a mulher, que pediu a separação. "Fiquei desnorteado. Brigava com todo mundo e inventava doença para justificar as faltas no serviço. Cheguei até a capotar o carro. Só me segurava no trabalho", conta o mecânico.
Há um mês, em uma manhã de sábado, depois de passar a noite bebendo, cheirando cocaína e fumando, ele invadiu a casa onde vive a ex-mulher, alegando estar com saudades da filha. Assustada, a mulher se trancou no quarto com a menina.
Inconformado, Paulo quebrou todos os vidros do carro que ele julgava ser da ex, que estava estacionado em frente à casa da sogra. O carro era da cunhada.
Na segunda-feira, ao chegar à Embraer, foi surpreendido com informação da assistente social de que a família da mulher havia ligado para a empresa relatando o episódio de sábado.
"A assistente social sugeriu que eu fizesse o teste toxicológico. Eu disse que faria só para provar a minha inocência. Mas na hora de coletar a urina, comecei a enrolar dizendo que não conseguia urinar", relata o mecânico.
Na realidade, ele queria ganhar tempo. Acreditava que um dia a mais poderia ser suficiente para apagar os vestígios da droga na urina. Por sugestão de amigos, passou a noite bebendo água.
No dia seguinte, com um vigilante enfermeiro na porta do banheiro, ele fez o teste. Três dias depois, com o resultado positivo do teste, foi encaminhado ao programa de tratamento da empresa. Os profissionais sugeriram a internação. "De início eu disse não. Argumentei que tinha sido uma exceção, que não era dependente."
Mas, após conversar com os pais, convenceu-se de que ir para a clínica era a melhor saída. Na companhia de outros seis dependentes químicos, todos empregados, ele está em tratamento, que é baseado nos 12 passos dos AA (Alcoólicos Anônimos). "Estou me preparando para voltar a viver livre das drogas. Quero voltar ao trabalho de cabeça erguida." (CC)


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