São Paulo, quarta-feira, 07 de março de 2007

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EVENTO FOLHA/ MAIORIDADE PENAL

Sem acordo sobre maioridade penal, debatedores defendem mudanças

Não há acordo, por menor que seja, sobre a redução da maioridade penal entre representantes de três das principais forças políticas do país. Há, no entanto, um ponto em comum: todos concordam que do jeito que está não dá mais.
As divergências -e a micro concordância- foram a tônica do debate realizado anteontem à noite pela Folha com o secretário da Justiça do governo paulista, o advogado Luiz Antonio Marrey Filho, com o chefe da Casa Civil do governo do Rio, o também advogado Regis Fichtner, e o prefeito de São Carlos, o engenheiro químico Newton Lima Neto. Marrey Filho vocalizava a proposta do PSDB, Fichtner, a do PMDB, e Lima Neto, a do PT.

Emancipação do infrator aos 16 anos, maior tempo de internação e legislações penais estaduais foram propostas

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, passou a defender a redução da maioridade penal após o assassinato brutal do menino João Hélio, aos seis anos. Um dos cinco acusados de o arrastarem de carro por mais de sete quilômetros, no dia 7 de fevereiro, tem 16 anos.
Fichtner foi o representante solitário da redução da maioridade penal dos 18 para os 16 anos. Sua justificativa é que o jovem mudou: "Não há dúvida de que na sociedade moderna está havendo um amadurecimento precoce das nossas crianças. O jovem de 16 anos hoje é o mesmo jovem de 50 anos atrás, quando foi criada essa maioridade penal? A mim parece que não", afirmou.
Ele defendeu também que os Estados possam criar legislações penais próprias, de acordo com suas particularidades -hoje esse tipo de lei é federal.
Ele considera a atual legislação excessivamente paternalista para com os adolescentes: "Sempre que você protege demais uma comunidade, você acaba a prejudicando. Adolescentes são recrutados pelo tráfico para praticar os piores atos", afirmou.
O chefe da Casa Civil do Rio propôs o que chamou de "transição" para a redução da maioridade: o juiz poderia emancipar um adolescente de 16 anos quando ele cometer um crime hediondo. Defendeu também mudanças na progressão da pena. Hoje, um adolescente que cometeu um ato infracional pode ser solto após cumprir 1/6 da pena. Fichtner defende que a progressão só ocorra após o cumprimento de 1/3 da pena.
Lima Neto apresentou uma proposta que é a antípoda da defendida pelo governador do Rio de Janeiro: quer a aplicação integral do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), negligenciado hoje pelas prefeituras e governos estaduais, na avaliação dele.
"É preciso dar aos adolescentes um Estado de bem-estar social. As políticas públicas precisam ser postas em prática, na direção de disputar o jovem carente em relação à sedução posta pelo tráfico de drogas."
O prefeito de São Carlos expôs dados para tentar provar que a aplicação integral do ECA dá resultados a curto prazo. Até o ano de 2000, de acordo com ele, São Carlos enviava 35 adolescentes para serem internados na Febem, atual Fundação Casa. Entre 2001 e 2006, esse número caiu para sete por ano, segundo ele.
Em 2007, o número de internos saltou para 15 por conta dos ataques a ônibus feitos pelo PCC (Primeiro Comando da Capital) no ano passado, ainda de acordo com o prefeito.
A cidade tinha no ano passado uma população estimada em 218.702 habitantes, segundo o IBGE. São Carlos é uma cidade tranqüila, segundo o Mapa da Violência divulgado na semana passada: ela ocupa a posição de número 1.563 no ranking nacional de homicídios, com 5.560 municípios. No Estado, está no 182º lugar.
Outro dado positivo apresentado por Lima Neto aponta que a reincidência em São Carlos é de 4% (segundo pesquisa da Universidade Federal de São Carlos), enquanto na Febem essa taxa atinge 29%.
O prefeito disse que é um equívoco mudar a lei para tratar a exceção (os adolescentes mais violentos). Os homicídios praticados por jovens variam de 1% a 3%, segundo Lima Neto. A aplicação da lei penal a partir dos 16 anos, na visão dele, traria um efeito contrário ao pretendido por aqueles que defendem essa medida.
"A redução vai trazer mais vigor para o crime. O crime vai recrutar jovens abaixo de 16 anos. O ingresso no sistema penal vai elevar a profissionalização do adolescente no crime." A reincidência também aumentaria, disse o prefeito petista.
Marrey Filho é contrário à redução da maioridade penal, defende a aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente, mas acha que a legislação foi omissa sobre os adolescentes mais violentos. "Temos de criar redes de proteção, cumprir o ECA, mas em alguns casos é preciso aumentar a internação", defendeu. "Temos adolescentes violentos que não podem ser jogados na rua, numa posição cômoda do Estado".
O secretário da Justiça defende a internação dos mais violentos para até dez anos -o limite hoje é três anos. Citou dois exemplos: o dos assassinos do menino João Hélio e Champinha, o adolescente que matou um casal de jovens, depois de ter estuprado a garota.
Segundo Marrey Filho, o aumento da internação para dez anos não é inconstitucional porque hoje um rapaz pode ser solto aos 21 anos -basta que ele cometa o ato infracional às vésperas de completar 18 anos.
Ele elogiou o programa aplicado pela Prefeitura de São Carlos, mas não o considera uma panacéia. Quis saber do prefeito o que ele faria com Champinha. "Toda vez que trabalhamos com exceção, a gente erra na regra. Champinha não é a regra. O rapaz do Rio também não. Se a gente for legislar por aí, a coisa complica", rebateu Lima Neto.


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