São Paulo, domingo, 07 de julho de 2002

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HISTÓRIA RESGATADA

Lobby para dar o prêmio de 2002 para a Pastoral da Criança tem carta inédita do físico alemão

Einstein indicou Rondon para o Nobel da Paz de 1925

RAYMUNDO COSTA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em campanha a fim de conseguir o Nobel da Paz de 2002 para a Pastoral da Criança, o governo federal se deparou com uma preciosidade: uma carta do físico Albert Einstein, escrita em 1925, recomendando ao comitê do prêmio o nome do marechal brasileiro Cândido Rondon (1865-1958).
Einstein redigiu a carta ao comitê do Nobel, sediado em Oslo (Noruega), a bordo do navio cap Polonio, depois de uma viagem de 51 dias pelo Brasil, Argentina e Uruguai, a maior parte dela passada no Rio de Janeiro.
"Seu trabalho se concentra na integração de tribos indígenas à civilização, sem o emprego de armas nem de qualquer tipo de coerção", testemunhou Einstein.
O físico não encontrou Rondon pessoalmente. Apenas ouvira falar dele "com grande entusiasmo" e assistira a um filme sobre o trabalho do explorador, geógrafo e pacificador Rondon.
A carta, assim como um manuscrito científico escrito por Einstein no Rio, foi encontrada em 1994, em Jerusalém, pelo professor Alfredo Tiomno Tolmasquim, do Museu de Astronomia e Ciências Afins do Rio de Janeiro.
Tolmasquim fazia pós-doutorado na Universidade de Jerusalém, onde está guardado o arquivo de Einstein, quando localizou o "dossiê Brasil", referente à passagem do físico pelo país em 25, ao qual os pesquisadores não haviam dado importância.
Com a carta, cujo inteiro teor permanece inédito, e um texto intitulado "Observações sobre a situação atual da Teoria da Luz", Tolmasquim localizou o diário de viagem do cientista, no qual se observa um Einstein antropólogo, atento "à deliciosa mistura étnica nas ruas" e à influência do clima quente e úmido no comportamento humano.
A carta, o manuscrito e o diário estarão em um livro que o professor Tolmasquim pretende publicar no final do ano, no máximo no início de 2003. Para o governo brasileiro, um incentivo a mais para intensificar o lobby em favor da Pastoral da Criança.
Com um orçamento de R$ 20 milhões anuais, a pastoral atende 1,6 milhão de crianças até os cinco anos. Ou seja, cada criança sai por cerca de R$ 1 por mês, graças sobretudo ao trabalho de 155 mil voluntários. Eles passam conhecimentos mínimos para as mães, como os cuidados ao cortar o cordão umbilical, a importância do aleitamento materno e de beber água não-contaminada.
O governo atribui boa parte da queda da mortalidade infantil no país, de 48 por mil nascidos vivos para 29 por mil nos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, ao trabalho da Pastoral da Criança. Zilda Arns, idealizadora da instituição, orgulha-se de que, nas regiões atendidas pela pastoral, o índice é de 13 para cada mil crianças nascidas vivas. A pastoral internacionalizou-se e hoje já atua em 14 países.
Inspirado em Einstein, que ganhou o Nobel de Física em 1921, o governo está tentando o apoio de outros prêmios Nobel. Já obteve o compromisso dos timorenses Ximenez Belo e Ramos Horta (1996), mas o argentino Adolfo Perez Esquivel (1980) e a nicaraguense Rigoberta Menchú Tum (1992) já se haviam comprometido com outras indicações.
No próximo dia 10, o governo lança um carimbo postal em homenagem à Pastoral da Criança. O passo seguinte do lobby será no dia 31, quando os presidentes dos países de língua portuguesa se reunirão no Brasil. Fernando Henrique Cardoso vai pedir o apoio de cada um deles.
Rondon não ganhou o Nobel da Paz em 25, mas voltou a frequentar a lista dos possíveis indicados no final dos anos 50. Depois dele, outro brasileiro chegou a ser mencionado, o arcebispo d. Hélder Câmara, mas a indicação foi boicotada pelo regime militar.
Esta é a segunda vez que a Pastoral da Criança é indicada pelo governo para o Nobel da Paz.


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