São Paulo, domingo, 07 de agosto de 2011

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Fim da estrada

Para fazer passarela pedida por moradores de Ilhabela, prefeitura passa retroescavadeira em trilha e abre discussão sobre reabertura de via

Daniel Marenco/Folhapress
Praia do Bonete, em Ilhabela, que ainda está preservada

LUISA ALCANTARA E SILVA
ENVIADA ESPECIAL A ILHABELA

Isolada, a praia do Bonete, em Ilhabela, (litoral norte de SP), não tem vendedor de colar nem de cerveja. Como não chega carro até lá -só é possível acessá-la de barco ou por uma trilha de 12 km a pé- o único barulho que se ouve é dos pássaros e do vento batendo nas árvores.
Porém, em dias de chuva forte, o acesso a esse paraíso -eleito uma das dez praias mais bonitas do Brasil pelo jornal inglês "The Guardian"- se torna impossível.
Com o mar bravo, não se pode ir nem sair de barco, e a água da chuva nas três cachoeiras da trilha (veja no mapa) impossibilita a travessia. Por isso, havia uma antiga reivindicação para que houvesse passarelas sobre esses cursos d'água.
Em junho, a prefeitura começou a atender esse pedido. Mas, ignorando o Plano Diretor, que diz que "o acesso ao bairro do Bonete deverá permanecer [...] com leito não carroçável" (ou seja, não pode passar nenhum veículo), entrou com máquinas retroescavadeiras na trilha.
Começou a polêmica. Embora o prefeito, Toninho Colucci (PPS), diga que precisou usar tratores para arrumar a pista e assim permitir que camionetes pudessem trafegar ali levando o material da obra da passarela, os moradores mais jovens e quem frequenta o Bonete começaram uma discussão.
Eles viram nessa ação da prefeitura a possibilidade de a trilha voltar a ser uma estrada e assim abrir o caminho para o turismo predatório.
"Se puder passar um carro, os jipeiros vão dar um jeito de invadir e acabar com o Bonete", afirma o advogado Edmur Carboni, que tem casa ali há dez anos e é frequentador há mais de 20.
André Queiroz, dono de uma pousada na praia e morador do local, diz que "se abrir uma estrada, vai haver processo de favelização". Ele diz que "é o pessoal mais velho que quer a estrada".
Os moradores mais velhos, a quem Queiroz se refere, querem a estrada há tempos. "Tenho 70 anos. Não tenho mais como ir a pé para o outro lado", diz o aposentado Ademar Dois Santos.
Ele e outros moradores acreditam que, além de poderem ir e vir de ônibus, a estrada facilitaria a chegada de energia elétrica. Hoje, a comunidade é abastecida por um gerador, que não dá conta de toda a demanda.
Mas, de novo, os mais jovens rebatem: "A luz é o grande problema daqui. Mas é só termos mais gerador. Não precisa de estrada", diz a merendeira Leila Góis de Souza, 32, que mora na praia.
E alguns moradores querem a estrada, mas sob condições. "Queria só que pudesse passar carro só em caso de emergência", diz a caseira Denora de Souza Santos, 53. "Porque, se abrir uma estrada e turista ficar usando, não vou mais poder ver meus netos brincarem soltos por aí. "

OBRA PARADA
Por enquanto, a prefeitura está impedida de continuar a obra da passarela.
Como o órgão começou a construção sem autorização do Parque Estadual de Ilhabela, onde está a trilha, a Polícia Ambiental embargou a obra no início de julho.
A diretora do parque, Carolina Poletto, diz que a prefeitura já enviou o pedido de licenciamento, que está sendo analisado pelo Estado.
Para a felicidade da turma antiestrada, ela diz que "foi acordado que o material [para fazer a passagem] poderá ser levado por barco e a pé".


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