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LETRAS JURÍDICAS
Alternativas de uso em imóveis urbanos
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
O Estatuto da Cidade (lei
nš 10.267/01), norma federal
sobre a política urbana, traz novidades a respeito do direito dos cidadãos que começam a ser sentidas por São Paulo com o último
Plano Diretor. Duas dessas novidades são particularmente importantes em virtude de sua repercussão sobre a vida dos munícipes: direito de superfície e outorga onerosa do direito de construir. Ambos merecem muita
atenção (veja bem, muita atenção) dos proprietários dos imóveis urbanos em todas (veja bem,
em todas) as cidades brasileiras.
Se o leitor -sendo proprietário- deixar o assunto de lado,
depois vai ter de se queixar ao bispo, como diziam os antigos.
O direito de superfície -de
usar o imóvel e aproveitá-lo como
melhor lhe pareça- é do proprietário. Preservada sua função social, o imóvel pode ser transferido
a outrem sem que o seu dono perca essa condição. Parece com a locação, mas não é a mesma coisa.
No direito de superfície, o proprietário (só ele e mais ninguém) pode conceder ao terceiro o direito
de utilizar o solo, o subsolo ou o
espaço aéreo relativo ao terreno.
A outorga onerosa do direito de
construir depende do Plano Diretor, pois cabe a este fixar as áreas
em que o coeficiente de aproveitamento básico dos terrenos pode
ser ultrapassado para fins de
construção. A lei esclarece que
coeficiente de aproveitamento é a
relação entre a área edificável e a
área do terreno. O Plano Diretor
também poderá delimitar espaços nos quais será permitida a alteração de uso do solo. Em ambos
os casos, os beneficiários terão de
oferecer contrapartida onerosa
para merecer o favor. Além do
Plano Diretor, deverá ser aprovada lei municipal específica, que
indique as condições a serem observadas para a outorga onerosa
do direito de construir e de alteração de uso, com a fórmula de cálculo para a cobrança e os casos
de isenção.
O direito de superfície e a outorga onerosa do direito de construir
e de alteração de uso são instrumentos de política urbana na
condição de institutos jurídicos e
políticos. Distinguem-se, pois só o
primeiro é levado a registro no
cartório imobiliário. Somente pode ser contratado por escritura
pública, mediante concessão gratuita ou onerosa. Há algumas regras específicas a serem lembradas. A primeira é a de que o superficiário responderá integralmente pelos encargos e tributos
que incidirem sobre a propriedade e proporcionalmente pela parcela de ocupação da área, nos encargos e tributos, salvo disposição
em contrário do contrato.
O leitor me fará, com certeza,
perguntas que já ouvi mais de
uma vez: mas isso vai funcionar?
Será objeto de mais corrupção?
Funcionará, como tem funcionado em outras partes do mundo.
Sempre possibilitará a corrupção,
que, embora seja lamentável, é
arraigada na operação moderna
do capitalismo, como se tem visto
nos Estados Unidos, em monumentais escândalos, que fazem os
nossos parecerem coisa de criança. Na corrupção há mais um elemento a considerar: sem prejuízo
da punição de outros agentes públicos e de outras sanções cabíveis, o prefeito incorrerá em improbidade administrativa quando aplicar os recursos auferidos
com a outorga onerosa do direito
de construir e de alteração de uso
em desacordo com o previsto
na lei.
As cautelas a serem adotadas
compreendem o acordo de vontades das partes e as normas de direito público. Qualquer negociação a respeito -até pela novidade das recentes leis- deve ser encarada com cuidado em virtude
de repercussões que a jurisprudência ainda não teve ocasião
de filtrar.
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