São Paulo, sexta-feira, 07 de outubro de 2005

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ROMANCE PROIBIDO

Na USP Leste, meninas dizem que trocavam "selinho" quando foram abordadas por policial; PM vê ato obsceno

Namoro de garotas vira caso de polícia

Eduardo Knapp/Folha Imagem
Bárbara e Melissa (nomes fictícios) se beijam em um dos corredores da USP Leste; as duas começaram a namorar há quatro meses


LUÍSA BRITO
DA REPORTAGEM LOCAL

O namoro entre duas garotas, na USP da zona leste, virou caso de polícia. Bárbara, 22, e Melissa, 18, (os nomes são fictícios) estavam na cantina da universidade, na tarde da sexta-feira passada, quando foram abordadas por uma policial militar que trabalha na região. Houve discussão e elas foram levadas para a delegacia.
As meninas, que namoram há quatro meses e se conheceram na própria universidade, dizem que uma estava no colo da outra e trocaram apenas um beijo, um "selinho". Na versão da PM, as duas se beijavam de forma acintosa e trocavam carícias nas partes íntimas, o que configurou "ato obsceno".
O caso, que ainda será analisado pela Justiça, ganhou repercussão na instituição e na internet. O diretor da USP Leste, Oswaldo Massambani, disse que a universidade não reprova o namoro.
As meninas afirmam que estavam numa mesa, na cantina, com vários colegas. Melissa estava sentada no colo de Bárbara e as duas se beijaram. Segundo elas, a policial, ao ver a cena, aproximou-se e disse não saber que a homossexualidade era permitida por lei.
As meninas e os colegas reagiram, dizendo que as duas podiam namorar ali. "Aí a policial começou com um discurso preconceituoso, dizendo que a USP era um lugar de mães de família e gente séria", disse Bárbara. "Estávamos conversando quando a policial chegou. Achei que ela não estava falando sério", afirma a aluna Patrícia Rezende, colega do casal.
Segundo as meninas, a discussão acabou porque um funcionário da USP convenceu a policial a deixar o local. Meia hora depois, elas foram informadas que o caso estava sendo registrado formalmente pela polícia e foram chamadas a assinar um termo. Como se recusaram, tiveram de ir até a delegacia de Ermelino Matarazzo, onde ficaram cerca de três horas.
Elas dizem ter se recusado a assinar o documento por considerar que ele não explicava qual crime teriam cometido. Um funcionário da USP as acompanhou até a delegacia, evitando que fossem levadas em um carro policial.
De acordo com o tenente Raul Marcel de Mendonça, responsável pelo patrulhamento da região, a policial afirmou que as duas estavam se "beijando de forma acintosa e passavam a mão uma nas partes íntimas da outra", o que configurou o ato obsceno. Segundo o tenente, a policial que abordou as meninas não estava trabalhando ontem e, por isso, não poderia ser entrevistada.
Bárbara diz que contou à família o que ocorreu e seus pais pediram apenas que fosse prudente, já que o caso envolve a polícia. O medo de Melissa, porém, é que a família descubra que ela namora uma garota. As duas preferem não revelar seus nomes.
O DCE (Diretório Central dos Estudantes) da USP pretende fazer um ato público contra o caso.
Para as meninas, a abordagem da policial e a ida para a delegacia foram constrangedoras. "Vou processá-la [a policial] mesmo sabendo que isso não mudará sua mente, mas é para ela saber que não fizemos nada ilegal", afirmou Bárbara. Na delegacia, foi registrado um documento (termo circunstanciado) e, agora, as duas serão ouvidas pela Justiça.
Bárbara e Melissa afirmam que costumam namorar na rua e que, geralmente, as pessoas mostram-se assustadas ou fazem brincadeiras. "De tudo o que já ouvi, isso [a declaração da policial] foi o mais agressivo", disse Melissa.


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