São Paulo, sexta-feira, 07 de outubro de 2005

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27 ANOS DE BATIDÃO

Segundo ele, só educação resolve situação

Playboyzada glamoriza "proibidão" e indiciar MCs é inútil, diz DJ Marlboro

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

Sob o codinome DJ Marlboro, Fernando Luís Mattos da Matta, 42, é o nome mais importante do funk carioca. Há 27 anos comandando bailes, ele se recusa a tocar os "proibidões", mas diz que o indiciamento dos MCs é inútil.
"O que resolve é educação", diz Marlboro. Para ele, a "playboyzada" glamoriza o "proibidão".
No início desta semana, a polícia indiciou 13 MCs (mestres de cerimônia) que se apresentam em bailes funk em comunidades pobres do Rio de Janeiro, sob a acusação de fazer apologia ao tráfico.
De acordo com a polícia, todos cantam músicas que exaltam traficantes, o consumo de drogas, facções ou atos criminosos. A investigação durou quase um ano.
Nesse período, os policiais conseguiram reunir material em vídeo, fotos e áudio para indiciar os cantores. Os funkeiros usavam sites para divulgar as suas músicas, conhecidas no Rio como ""proibidões". Assim como DJ Marlboro, as rádios se recusam a veiculá-las.

 

Folha - Você concorda com o indiciamento dos autores dos "proibidões"?
DJ Marlboro
- Sou radicalmente contra os "proibidões". Eles não somam nada para o menino da favela, para a comunidade, para o cidadão comum ou para o funk. Mas, se o que eles cantam é reflexo do que vivem no dia-a-dia, calar sua boca não vai mudar a realidade, nem vai impedir que sejamos vítimas do que eles cantam. O indiciamento não tem utilidade nenhuma.

Folha - E o que deveria ser feito?
Marlboro
- O MC que faz isso deve ser advertido, orientado, ver que existem novos horizontes, que ele pode falar da realidade em que vive buscando alternativas para ela, como outros MCs fazem.
Mas como eu vou cobrar isso se ele não teve estudo decente, não teve acesso a tudo o que a classe média tem? Punição ideal para ele seria fazer música nos orfanatos, ser orientado por psicólogos e escritores, direcionar o talento dele para coisas positivas. O que resolve é educação.

Folha - Esses MCs fazem apologia ao crime?
Marlboro
- Acho que fazem muito mais apologia as pessoas de classe média que ficam de dedinho para o alto cantando "proibidão", glamorizando aquilo, comprando CDs piratas. E eu vejo demais isso nos bailes. A playboyzada não sabe nem do que está falando, não sabe como aquela realidade é cruel para as pessoas que vivem nas comunidades.
O MC é vitima do que está cantando. Quanto mais o playboy glamoriza, mas esse glamour vai ganhando força na comunidade, e o garoto passa a querer ser bandido, vai ser o carrasco dele [playboy]. É uma bola de neve.

Folha - O que você tem feito para mudar o caminho desses MCs?
Marlboro
- O que eu gastei de saliva... Venho falando há anos e já consegui muitas coisas. Botei muita gente para cantar outras coisas, e os caras decolaram.
Eu fiz os dois volumes de "Proibidão Liberado" para que esses MCs contassem suas histórias de forma positiva, sem facções, sem apologias.
A maioria está indiciada agora. Mas fechar a porta para eles não vai adiantar. O funk é a única oportunidade que eles têm de sair daquela vida. Nosso papel como sociedade é orientar.


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