São Paulo, sábado, 08 de abril de 2006

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JUVENTUDE ENCARCERADA

Medida foi adotada após rebelião destruir 2 unidades; governador diz que novos prédios vão atrasar

Febem manda 131 adolescentes para a prisão

DA REPORTAGEM LOCAL

Em meio a uma nova crise, a Febem adotou ontem uma antiga fórmula para superar a falta de vagas provocada pela destruição de unidades em rebeliões: transferiu internos para uma penitenciária destinada a adultos.
Desta vez, 131 jovens do complexo do Tatuapé (zona leste de São Paulo) foram levados para o prédio ocupado até 2005 por uma penitenciária feminina, localizada no mesmo quadrilátero.
A transferência, pelo prazo máximo de seis meses, foi anunciada pelo governador de São Paulo, Cláudio Lembo (PFL). Logo depois, ele admitiu, contrariando os anúncios de seu antecessor e presidenciável Geraldo Alckmin (PSDB), não ter condições de garantir a entrega, até o final deste ano, das 41 unidades que a fundação pretende construir para desativar completamente o Tatuapé.
"Temos segurança absoluta em 12 unidades até o fim do ano. Queria mais, queria as 40, mas não vou ser demagogo. Com segurança, com os pés no chão, 12 estarão prontas. As outras, faremos de tudo para aprontar", disse. As 12 unidades representam cerca de 670 vagas. A Febem Tatuapé abrigava, antes da transferência de ontem, cerca de 1.220 adolescentes.
Esta foi a quarta vez que a Febem transferiu internos para cadeias desde 1999, quando uma rebelião destruiu o complexo Imigrantes (veja quadro).
O envio de jovens para uma prisão contraria o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), que prevê que os jovens devem cumprir a medida socioeducativa em unidades que oferecem tratamento diferenciado, com escola e atendimento psicológico.
A autorização judicial para a nova transferência tem caráter emergencial. O corregedor-geral da Justiça, Gilberto Passos de Freitas, determinou a transferência de 131 internos das unidades 14 e 23 do complexo do Tatuapé, destruídas em uma rebelião ocorrida entre terça e quarta-feira. Os jovens foram levados para três alas reformadas da penitenciária. Antes de abrigar detentas adultas condenadas, entre 1991 e 2005, o prédio era utilizado pela Febem.
Atualmente, a entidade tem 5.800 internos em todo o Estado. No ano passado, eram 6.757; em 2004, 6.620; em 2003, 6.705.
No relatório que embasou a decisão, o juiz auxiliar Reinaldo Cintra Torres de Carvalho, que vistoriou o Tatuapé, afirmou que as unidades estão completamente destruídas. "A Febem informou que não tem vagas para transferir internos com esse perfil [grave] para outras unidades."
Mas ele também afirmou que a transferência foi autorizada porque a construção de unidades da Febem está em andamento.
Em março de 2005, Alckmin prometeu construir as 41 unidades em 150 dias e desativar o Tatuapé. Na ocasião, afirmou que as unidades seriam erguidas em áreas do Estado e, por isso, não haveria necessidade de autorização dos municípios, principal argumento utilizado hoje pela presidente da entidade, Berenice Giannella, para justificar a não-conclusão das obras.
Em 22 de fevereiro, apesar de o governo já admitir atrasos nas obras, a Febem divulgou nota na qual prometia as novas unidades para o fim deste ano.
Entidades de direitos humanos que fizeram a acusação de maus-tratos e espancamento de internos do Tatuapé na OEA (Organização dos Estados Americanos), em novembro de 2005, criticaram a transferência dos jovens.
Hélio Bicudo, diretor da Fundação Interamericana de Defesa dos Direitos Humanos, afirmou que transferir jovens para penitenciária de adultos é "absurdamente ilegal". Ele revelou que pretende revogar, em instâncias superiores da Justiça, a transferência.
(ANDRÉ CARAMANTE, CONRADO CORSALETTE E GILMAR PENTEADO)

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