São Paulo, domingo, 08 de abril de 2007

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Relatório já apontava controle aéreo inseguro

Documento da federação internacional de controladores, feito após acidente com o Boeing da Gol, foi enviado a Lula

Falta de preparo dos operadores e equipamentos obsoletos estão entre os problemas apontados; governo nada respondeu

LEILA SUWWAN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O sistema de controle de tráfego aéreo brasileiro é falho e tem um nível baixo de segurança. Os controladores não têm preparo, os equipamentos são velhos, não há suporte técnico, a cobertura de rádio é ruim e os sistemas operacionais são inadequados. E, apesar disso, a Aeronáutica afirma ter um dos melhores e mais modernos sistemas do mundo.
Esse é o resumo do relatório preparado pela Ifatca (Federação Internacional das Associações dos Controladores de Tráfego Aéreo) após uma vistoria geral do Cindacta-1 (Brasília) em outubro do ano passado, em decorrência do choque entre o Boeing da Gol e o jato Legacy que deixou 154 mortos em 29 de setembro.
O documento interno, obtido com exclusividade pela Folha, lista os problemas que acabaram sendo evidenciados nos últimos seis meses de crise aérea, como a precariedade do sistema de gerenciamento de freqüência de rádio ou de planos de vôo. Confirma o despreparo e a sobrecarga dos controladores de tráfego aéreo.
E aponta para outros problemas que podem causar novos episódios no apagão aéreo, já que eles não teriam sido solucionados desde então.

Relatórios
Os resultados foram enviados, em caráter confidencial, para a OACI (Organização da Aviação Civil Internacional) e para a Ifalpa (Federação Internacional das Associações de Pilotos de Linhas Aéreas).
E uma carta foi enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 9 de novembro de 2006 para oferecer assessoria e consultoria para auxiliar o governo na construção de um marco institucional novo, mais transparente e seguro.
"Esperamos que as autoridades brasileiras adotarão uma fórmula sistêmica para melhorar a segurança dentro do sistema de aviação civil brasileira, com base na premissa de que operadores, individualmente ou em grupo, são exclusivamente responsáveis por acidentes ou incidentes", diz o texto. Não houve resposta.
Passados meses de crise e o motim dos controladores no último dia 30, a Ifatca fez apelos públicos sobre o risco de novos acidentes aéreos e a necessidade urgente de modificar o sistema, que tem falhas sérias de segurança.
O relatório foi elaborado após a visita de três representantes da federação. Além de auxiliar no tratamento de estresse pós-traumático dos controladores, a Aeronáutica concedeu acesso pleno aos profissionais e a parte das instalações do Cindacta-1.
Os representantes da Ifatca conversaram com controladores, técnicos e oficiais. Observaram os trabalhos e os equipamentos usados.
Internamente, os resultados foram considerados "assustadores". E não foram liberados antes devido à expectativa de que mudanças seriam rapidamente feitas.

Inexperiência
Os controladores foram considerados muito jovens, inexperientes e mal-treinados. O nível de inglês estava longe do esperado e havia desconhecimento sobre procedimentos-padrão da OACI.
Foram detectados riscos na sobrecarga e estresse dos controladores, devido ao volume de tráfego aéreo, armadilhas do sistema e a necessidade de sempre ter que lidar com os problemas técnicos, principalmente rádio e radar.
Foi constatado que há defasagem em equipamentos, além de falta de suporte adequado. Os técnicos que foram contatados pelos auditores também não teriam o preparo necessário para a atividade.
A falta de sistemas para emergências ou "backups" adequados foi destacado. Segundo a Ifatca, não havia um telefone independente para o caso de perda de contato com os outros Cindactas.
Não havia rádio de emergência independente ou um "backup" do sistema central para o caso de queda geral de freqüências -o que ocorreu com a pane do equipamento registrada dois meses depois, no apagão de 5 dezembro.
Era esperado encontrar um sistema alternativo para leitura dos sinais de radar, mas só existe um. Outros mecanismos de segurança também estavam ausentes, como um "stand by" independente do sistema de planos de vôo e seu "backup".

Zona cega
A zona cega na região onde ocorreu o acidente do vôo 1907 foi verificada, apesar de o local estar coberto pelo radar do centro de Manaus.
Segundo a Ifatca, é relativamente simples enviar a visualização do Cindacta de Manaus para o Cindacta de Brasília.
Esse problema já estaria sendo corrigido por meio do envio do sinal de radar ao Cindacta-1 (Brasília), mas havia dificuldades técnicas.
O relatório não entra em detalhes sobre a questão militar, mas comenta que a hierarquia e peculiaridades internas de relacionamento entre Cindactas e Comando da Aeronáutica não permitiam o diagnóstico de problemas e o encaminhamento de melhorias.


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