São Paulo, domingo, 08 de maio de 2005

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AMBIENTE

Local que abastece 3,5 milhões perdeu 21% de seu reservatório de água, principalmente para favelas e loteamentos

Até carvoaria destrói represa Guarapiranga

AFRA BALAZINA
DA REPORTAGEM LOCAL

O cenário não é nada otimista: um estudo sobre a bacia da Guarapiranga, que abastece 3,5 milhões de pessoas da Grande São Paulo, revela que de 1989 a 2003 ela perdeu 21% da área de reservatório de água e 3,13% de cobertura vegetal. A ocupação urbana, em grande parte feita por loteamentos irregulares e favelas, cresceu 1.440 hectares em 14 anos (17,9%).
O trabalho mostra ainda problemas atuais que prejudicam a área de manancial, como carvoarias ilegais que utilizam árvores da mata atlântica para a produção. Os fornos ficam escondidos em morros de difícil acesso e ao seu redor existem clareiras.
A partir de denúncias feitas pelo ISA (Instituto Socioambiental), autor do estudo, uma das carvoarias existentes teve dez fornos destruídos em Embu-Guaçu. Foi feita uma operação conjunta entre a prefeitura local e a Polícia Ambiental na última quarta-feira.
Segundo a coordenadora de Mananciais do ISA, Marussia Wathely, o estudo mostra que 60% da bacia já foi alterada pelo homem. Em 2003, a maior parte da área estava ocupada por "usos antrópicos" -referentes à ação humana sobre a natureza, como atividades de pastagens, agricultura e mineração. Depois de aberto o terreno para esses usos, a ocupação urbana pode ser realizada mais facilmente.
"A diminuição da área ocupada pela água, que indica um assoreamento, é bastante preocupante. Fica uma folga muito pequena entre o que se produz e o que se consome de água", afirmou.
Outro problema diz respeito à chegada da cidade à represa, apesar de o perfil da ocupação urbana ter mudado ao longo dos anos. "Antes, criavam-se grandes loteamentos irregulares vinculados aos movimentos de moradia. Hoje, os núcleos menores estão se adensando de forma totalmente desordenada", disse. Isso dificulta a implantação de infra-estrutura, como rede de esgoto, e equipamentos sociais -postos de saúde e escolas, por exemplo.
Os dados foram apresentados ao secretário de Estado do Meio Ambiente, José Goldemberg, na segunda-feira passada. Outras denúncias feitas pelo ISA na ocasião tratavam da atividade de carvoaria perto do parque ecológico Guarapiranga e de uma área com movimentação de terra e depósito de lixo não-orgânico nas margens dos cursos de água na várzea do rio Embu-Mirim (o que pode causar assoreamento no local).
"Deve-se refletir sobre como as atividades econômicas podem ocorrer na área sem comprometer o quadro já grave", diz Marussia. Ela lembra que há quatro anos uma lei específica para a Guarapiranga é discutida na Assembléia Legislativa, sem conclusão.
Em sua opinião, a responsabilidade deve ser compartilhada entre todos os municípios da bacia. "Ações isoladas não resolverão."
O assessor da diretoria metropolitana da Sabesp, Ricardo Araújo, 50, concorda que não existe solução simples. "O reservatório é abraçado por uma ocupação urbana muito caracterizada pela economia informal, baixa renda e dependência de ações governamentais. Não conhecemos no mundo situação semelhante."
De acordo com ele, deveria-se criar infra-estrutura, impedir novas ocupações e investir na sofisticação tecnológica do tratamento de água. Araújo afirmou ainda que o problema maior não é a quantidade da água na Guarapiranga, mas a qualidade.
"Todo tipo de detrito que a cidade produz é levado para o reservatório: esgoto, lixo, sedimentos, poeira. Tudo isso tem um impacto na qualidade." E, quanto maior a poluição, maior é o gasto para tratamento.
Ele tem uma versão para o aumento da ocupação. "O mercado imobiliário e a verticalização estão crescendo na marginal Pinheiros e na [av. Engenheiro Luís Carlos] Berrini, vizinhas à bacia. Pessoas que trabalham como vigias, recepcionistas e domésticas nessas áreas cruzam o espigão e moram na Guarapiranga."
Goldemberg afirmou que o Estado e a prefeitura negociam criar um decreto em conjunto para proteger os mananciais.
O estudo, chamado de Diagnóstico Socioambiental Participativo, deve ser publicado em junho.


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