São Paulo, quinta-feira, 08 de junho de 2000


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MEIO AMBIENTE
Restos da produção de 40 empresas foram depositados ilegalmente na zona rural de duas cidades de Minas
Justiça dá prazo à Fiat para retirar lixo

THOMAS TRAUMANN
DA REPORTAGEM LOCAL

RANIER BRAGON
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

A Justiça de Minas Gerais (MG) deu prazo de cinco dias para que a Fiat e duas de suas fornecedoras, a Formitap e a Interni, apresentem plano de retirada das sobras industriais depositadas ilegalmente na zona rural de Formiga.
O juiz Wauner Batista Ferreira Machado, da 2ª Vara Cível de Formiga (208 km de Belo Horizonte), concedeu liminar à ação civil pública proposta pelo promotor de Justiça Lindolfo Barbosa Lima.
O lixo automotivo -cerca de 1.500 toneladas- jogado em voçorocas (erosões gigantescas) é composto por fibras de vidro, espuma, cola e ligas metálicas. O material, com o tempo, contamina o solo e os lençóis freáticos. Parte do lixo foi despejada próximo ao rio Formiga, que abastece a cidade de 60 mil habitantes.
As duas fornecedoras da Fiat e uma terceira, a Standart, foram multadas em R$ 250 mil, mas a punição final pode passar de R$ 1 milhão. Elas são fabricantes de revestimento de portas, pisos e tetos de carros da montadora.
A decisão judicial determina ainda que o Ibama e a Feam (Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais) aprovem o plano de retirada, em cinco dias, após sua apresentação.
O prazo dado pela Justiça começa a valer após a notificação das empresas, o que deve ocorrer na próxima semana. A multa, em caso de descumprimento, foi fixada em R$ 10 mil ao dia.
Além da Fiat, Alcan, Goodyear e Ultrafértil serão processadas por crime ambiental. No total, são 40 empresas acusadas pelo Ministério Público de enterrar e vender ilegalmente milhares de toneladas de sobras da produção de carros, vidros, embalagens plásticas e de papel, resíduos químicos e emborrachados, entre outras sucatas industriais despejadas em cidades do interior de Minas Gerais.
Esse é o processo ambiental mais complexo do país. As indústrias reconhecem que são restos de produção encontradas nas zonas rurais das cidades de Formiga e Córrego Fundo, mas dizem que eles foram desviados por fornecedores e empresas terceirizadas.
De acordo com as investigações do Ministério Público, no mínimo, essas empresas serão denunciadas como co-autoras.
De acordo com a Lei de Crimes Ambientais, as multas podem passar de R$ 20 milhões.
"Grandes empresas não podem fugir da responsabilidade apenas porque contrataram alguém para se livrar do seu lixo. Elas são responsáveis por todo o processo industrial", afirmou o promotor de Justiça de Formiga, Lindolfo Barbosa Lima.
A maior parte do lixo foi vendida a pequenas usinas de cal do centro-oeste mineiro que ilegalmente queimam o material no seu processo de produção.
Existem notas fiscais comprovando a compra do lixo.
Dos seis exames preliminares de amostras de cinzas das usinas de cal de Formiga, um apresentou contaminação de dioxinas (subproduto de processos industriais com uso de cloro), segundo testes do CGEQ, laboratório especializado da Petrobrás. No total, serão feitos exames de 40 amostras das cinzas e do solo.
Para o engenheiro químico Marcelo Furtado, coordenador da campanha internacional de substâncias tóxicas da organização Greenpeace, o risco de contaminação na região é grande.
"Durante oito anos, a fumaça e a cinza originárias da queima de borracha, plástico e tubos de pvc ficaram espalhadas. Isso não ocorre sem consequências."
Foram investigações do Greenpeace que levaram o Ministério Público aos donos de usina de cal.
Também serão pedidos exames sobre a qualidade da carne e do leite produzidos na região. Os testes feitos no rio Formiga, que abastece a região, não apresentaram contaminação.
Não existem indicativos confiáveis de que o lixo tenho provocado problemas de saúde entre os moradores da região.
As zonas rurais de Formiga e Córrego Fundo e Arcos são depósitos ilegais de lixo industrial há, no mínimo, oito anos. As investigações dos órgãos ambientais começaram em 99.
Em setembro, técnicos da Feam e do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) comprovaram que três fornecedoras da montadora Fiat enterraram em Formiga 1.500 toneladas de fibras de vidro, espuma e estruturas metálicas jogadas em voçorocas (erosões gigantes).
Em maio, descobriu-se que essa sucata era apenas a parte mais visível do crime ambiental. A maior parte do lixo já havia sido queimada e usada como combustível nos fornos de cal. Posteriomente, as cinzas eram usadas como fertilizante para os pastos de gado.
Depois da descoberta da queima do lixo, dois donos de usinas de cal foram presos e dez dessas empresas foram fechadas.
Pressionadas pelas investigações, os caeiros entregaram ao Ministério Público 130 notas fiscais de compra de "refugo" com carimbos das Receitas Estaduais mineira e paulista.
A maior parte das notas são de fornecedoras da Fiat e da Alcan. Entre as 40 empresas citadas no processo, 35 são paulistas. Em alguns casos, o lixo foi transportado por quase 1000 quilômetros para ser despejado no interior de Minas Gerais.



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