São Paulo, quinta-feira, 08 de junho de 2006

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Tiroteio fere 17 crianças dentro de escola no Rio

Suposto confronto entre traficantes e PMs levou pânico a alunos e professores

Oito dos 306 estudantes da escola municipal foram levados para o hospital; cinco, que foram baleados, passaram por cirurgias


RAPHAEL GOMIDE
TALITA FIGUEIREDO
DA SUCURSAL DO RIO

ITALO NOGUEIRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DO RIO

Quando as mães chegaram ontem à escola municipal Henrique Foréis, no morro da Fazendinha (complexo do Alemão, zona norte do Rio), a cena era de pânico: crianças ensangüentadas, chorando e escondidas debaixo das carteiras, aterrorizadas. Além dos gritos, havia sangue espalhado nas carteiras, paredes e roupas.
Esse foi o resultado de um tiroteio que feriu, na manhã de ontem, 17 crianças, de acordo com a Prefeitura do Rio. Seis delas foram atingidas por tiros, duas por estilhaços e as outras ficaram feridas na tentativa desesperada de fugir.
Algumas estavam na sala de aula. Outras, no pátio. As balas atingiram o muro, furaram paredes e janelas da escola.
Cinco passaram por cirurgias e continuavam internadas até a conclusão desta edição. Uma menina, de oito anos, levou um tiro no abdômen. Um menino, de 11 anos, foi atingido no fêmur do lado esquerdo.
Os tiros foram supostamente disparados por traficantes que tentavam atingir PMs que estavam no local. Alguns moradores, porém, acusam a polícia de ser a responsável pelos tiros.
A jovem Raquel Cardoso, 8, ferida de raspão no braço direito estava na sala de aula, fazendo a lição, na hora do tiroteio. "A tia mandou todo mundo abaixar. Fiquei com muito medo, foram muitos tiros. Chorei até a hora em que minha mãe chegou ao hospital", contou.
Aluna da 2ª série, a menina acredita que o tiro que a feriu atingiu também sua amiga, Raquel Ferreira, baleada no braço esquerdo. "Ela estava do meu lado, aí a bala bateu no braço dela e depois raspou no meu."
Uma prima de Raquel, que não quis se identificar, disse ter ido à escola buscar a sobrinha. Nunca iria imaginar a cena que encontrou. "O tiroteio começou na favela, mas não nos preocupamos com as crianças, que estavam na escola. Acabaram os tiros e fui buscar minha sobrinha, com medo de retaliações ou de o comércio fechar. Quando cheguei, estavam todos encolhidos, gritando. Minha sobrinha não se machucou, mas estava apavorada, suja do sangue de uma colega. A menina não quer voltar à escola."
Vice-presidente da Associação de Moradores da Fazenda das Palmeiras, Galileu Vieira, 46, foi um dos primeiros a socorrer as crianças, levando-as em uma Kombi ao posto médico mais próximo. "Elas estavam assustadas, sangrando, pedindo a mãe e o pai", afirmou.

Até quando?
"Minha menina está traumatizada. Ri e chora ao mesmo tempo. A gente não tem voz para reclamar de nada. Até quando isso?", perguntou o auxiliar de serviços gerais Everaldo Caetano, pai de Cristiane, 8, que estava no recreio da escola na hora do tiroteio.
O comandante do 16º BPM (Batalhão de Polícia Militar), José Nepomuceno, informou que os PMs foram à favela checar a denúncia de que ali haveria caminhões e carros roubados. Os caminhões não foram encontrados, mas a polícia começou a checar algumas motos que estavam próximas à escola.
"Os policiais chegaram a revistar a casa de um desses motociclistas e, ao sair, foram atacados por traficantes. Eles não tiveram nem tempo, nem ângulo para revidar. Uma testemunha confirmou as informações da PM", disse o delegado Eduardo Freitas.
O delegado enviou ao local uma equipe de peritos, mas a escola estava trancada. "Tentei várias vezes falar com a diretora da escola, mas ela não respondeu. Agora a perícia vai ter que ser feita amanhã [hoje]. Só assim teremos a certeza de onde vieram os tiros", disse.
Hoje serão feitas buscas ao traficante Tota, chefe do tráfico local. Segundo o delegado, Tota tem fama de ser "sanguinário".


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