São Paulo, domingo, 08 de julho de 2007

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Justiça manda indenizar recepcionista por racismo

Trabalhadora diz que era chamada de "macaca"; transportadora vai recorrer

Transportadora da capital paulista foi condenada em 1ª instância pela Justiça a pagar R$ 6.188 por danos morais à ex-funcionária

DA REPORTAGEM LOCAL

Que quantia em dinheiro pode compensar a humilhação de ter sido chamado de "macaco", "burra" e "analfabeta" no ambiente de trabalho?
A Justiça paulista fez as contas: R$ 6.188, no caso da recepcionista Renata Ribeiro de Almeida, 33, que afirmou ter sofrido com esses e outros xingamentos quando trabalhava na Intercontinental Transportation Ltda., entre 2005 e 2006.
A firma foi condenada em primeira instância a pagar a indenização e as despesas do processo, mas afirma que deverá recorrer da decisão.
"Houve depoimentos contraditórios, e a empresa não teve tempo para preparar bem a sua defesa", diz Roberto de Azevedo, advogado da transportadora, que nega as acusações.
"Duvidei muito que conseguiria ganhar a causa, mas não custava tentar. Aguentar aquilo era horrível", diz Renata, que hoje é recepcionista de um salão dos Jardins freqüentado por atrizes como Mariana Ximenes e Denise Fraga.
Ela conta que, no dia do julgamento, as suas testemunhas (ex-funcionárias da empresa) relataram o uso de outros xingamentos por um chefe e outros colegas. "Quando eu virava as costas, aí é que a coisa piorava mesmo." As ex-colegas repetiram expressões usadas, como "imprestável" e "aquela macaca não sabe fazer nada".
"Processos por racismo ainda não são muitos, mas a sociedade está começando a entender que tem direito à reparação", diz Marco Antonio Zito Alvarenga, presidente da Comissão do Negro e de Assuntos Antidiscriminatórios da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo.
Um dos impasses para quem sofre preconceito e quer entrar na Justiça é a falta de provas. "No caso da Renata, as testemunhas foram muito enfáticas, o que foi fundamental", diz Ana Bárbara Costa Teixeira, advogada da ex-recepcionista.
Além de processo por danos morais, como foi o caso de Renata, a lei brasileira prevê outra possibilidade de punição por racismo, por exemplo, quando alguém é preterido em um emprego ou é barrado em uma festa em razão da cor.

Trabalhistas
O preconceito de cor não foi o único dissabor que a recepcionista diz ter sofrido na empresa. Ela conta que levou "um susto" ao receber sua carteira de trabalho. "Me registraram como faxineira, argumentando que não tinha jeito, que não poderiam me colocar ganhando mais", diz ela, que recebia R$ 450. "Ninguém mais ali era registrada como faxineira. Só eu, a única negra."
A Intercontinental Transportation também foi condenada a pagar valores referentes aos direitos da recepcionista no período (cerca de um ano) em que trabalhou sem registro.
Segunda de cinco filhos de uma dona-de-casa e um funcionário do INSS, Renata trabalha desde os 15 anos. "Comecei como ajudante em uma fábrica de tênis, mas o que gosto mesmo é de lidar com público, atender as pessoas. Sou muito feliz fazendo isso que eu faço", afirma.
Ela, que sonha em fazer faculdade de serviço social, diz que nunca antes havia sofrido agressões racistas no ambiente de trabalho. "O que acontece, de vez em quando, é a pessoa te olhar de cima a baixo numa entrevista de emprego, e aí te dizer: "Não tem vaga". Mas não é sempre, não."
(DANIEL BERGAMASCO)


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