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São Paulo, domingo, 09 de fevereiro de 2003

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VESTIBULAR

Alunos acham que cotas devem ser temporárias, até as escolas públicas se equipararem às instituições privadas

Estudantes negros temem discriminação

Marco Antônio Rezende/Folha Imagem
Da esq. para a dir., os vestibulandos Luís Orlando de Oliveira, José Augusto Fonseca, Marluce Brás, Ana Paula Longobuco e Igor Amatolli


DA SUCURSAL DO RIO

Estudantes negros entrevistados pela Folha comemoram as cotas na Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), mas temem o preconceito dentro da universidade e a dificuldade para concluir o curso, caso não haja ajuda financeira para a compra de livros e materiais.
Todos são unânimes em afirmar que o sistema de cotas é uma das poucas formas para que eles consigam cursar uma faculdade pública.
O fato de quase todos os candidatos negros terem completado os ensinos fundamental e médio em escolas públicas os preocupa. Sem as cotas, dizem, a competição com alunos de colégios particulares é desleal.
"Por mais bem preparado que um aluno esteja, não dá para competir, porque a escola pública não dá embasamento suficiente", diz Ronaldo de Souza Pinto, 48, que fez seu sétimo vestibular para medicina na Uerj.
Os alunos que se candidataram pelo novo sistema também acham que as cotas devem ser temporárias, até as escolas públicas recuperarem a defasagem em relação às instituições privadas.
"As cotas devem servir para corrigir uma distorção de longa data, em que negros e pobres ficaram excluídos, e devem ser o início de uma revisão da educação pública no país", opina Marluce de Moraes Braz, 19, candidata ao curso de direito da Uerj.
"Mesmo sendo uma ajuda, seria bem melhor poder entrar por nós mesmos", concorda José Augusto Fonseca, 21, que prestou vestibular para história.

Preconceito
O preconceito também preocupa os futuros universitários. Eles acham que a discriminação poderá vir dos alunos que passaram no vestibular dentro do sistema tradicional.
Para Kelly Cristina dos Santos, 25, que prestou vestibular para pedagogia, os negros podem ser vistos como "incompetentes e incapazes", porque precisaram das cotas para conseguir entrar na universidade.
"Vamos lutar para que isso não aconteça, porque estudamos como todo mundo. A única diferença é que o acesso, para a gente, é muito mais difícil. Não é uma questão de capacidade, mas de oportunidade. Oportunidade de estudar em boas escolas, o que não tivemos."
Igor Anatoli, 20, está receoso do preconceito e das dificuldades que os alunos negros poderão enfrentar. Ele, que se inscreveu para a faculdade de direito da Uerj, acha que a discriminação se dará, principalmente, nos cursos considerados de elite, como medicina, economia, engenharia e direito.
"As pessoas estavam acostumadas a ver negros nos cursos de pedagogia, letras e serviço social, que são mais fáceis de entrar. Encontrar um negro de terno e gravata numa universidade, sem que ele esteja trabalhando como segurança, e, mais tarde, num tribunal, vai chocar a sociedade", disse Anatoli.

Ajuda financeira
Os futuros alunos dizem que, se não houver um auxílio financeiro para a compra de livros e materiais, muitos não conseguirão levar o curso até o fim.
"Mais do que apoio pedagógico e aulas de reforço, que todos estão preocupados em oferecer para que o desnível entre os alunos negros e os demais não seja muito grande, a ajuda financeira é muito importante. Sem ela, muita gente pode ficar pelo caminho", disse Luiz Orlando de Oliveira, 24, que prestou vestibular para pedagogia. (AG e SP)


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